“Trabalho de manhã, todos os dias, das nove horas a uma, e depois ao fim do dia. Faço sempre isso, mesmo aos domingos, desde os meus 16 anos. E escrevo diversas vezes cada romance. Como os pintores da Idade Média, passo algumas demão de tinta. Escrevi duas vezes A Romana e três vezes O Conformista. Mas também acabei Agostinho em um mês... Levanto-me e coloco-me à mesa para trabalhar. Escrevo diretamente à máquina. É o gesto e o movimento que contam. No início da minha carreira, escrevia três ou quatro linhas por dia e sentia-me esgotado. Agora, tudo isso se tornou mecânico: logo de manhã sinto que devo sentar-me à minha mesa de trabalho. É assim a minha maneira de ser... Sei que certos escritores franceses trabalham durante todo o dia. Isso me parece prejudicial. Deve esquecer-se durante uma boa parte do dia de que se é escritor. Em arte, o tempo é, de resto, uma medida convencional: pode-se em dez minutos recuperar alguns anos de preguiça ou de obscuridade. A inspiração não se importa com o tempo. Verifica-se isso, verdadeira e fisicamente, nos momentos de inspiração: a inteligência executa, então, operações com uma rapidez extraordinária. Não é de espantar que Stendhal tenha escrito A Cartuxa de Parma em quarenta dias’.
Fonte: CHAPSAL, Madeleine. Os escritores e a literatura.
Lisboa: Dom Quixote, 1967.
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