"Costumo dizer que é muito difícil eu ter uma história para contar, não costumo ter um enredo na cabeça. Eu tenho uma primeira palavra, uma primeira frase. Não escrevo a partir de uma ideia maravilhosa, escrevo sem saber onde aquela história vai dar. Então eu preciso sempre de uma primeira frase. O que eu escrevo, na verdade, é música. Escrevo rimado, cheio de som, de ritmo, então eu preciso de uma primeira palavra (e essa primeira palavra eu colho na rua). Estou ali em um ônibus, ai escuto uma frase e digo: “eita, isso dá um conto maravilhoso”. Não sei qual é o conto que vai dar, mas guardo aquela frase na minha memória para poder trabalhar com ela. Às vezes, na televisão, uma pessoa diz uma coisa e eu penso novamente: “isso ai dá um conto”. Não sei qual, mas vou lá, como alguém que compõe uma música, coloco aquela primeira frase no papel e vou trabalhando. Às vezes está numa manchete de jornal, em um livro que não tem nada a ver (de antropologia ou de biologia). Às vezes vejo uma palavra bonita e quero fazer algo com ela. E meio que vai no repente, no improviso.
Fonte: http://www.domtotal.com em 11/04/2011
“Não tenho hora para escrever. Sempre estou atrasado. Paro em frente ao computador só quando a frase não pode mais esperar. Guardo a coisa até estourar. Algo que ouvi na rua, algum som que catei na TV. A partir dessa primeira faísca é que vou contando/cantando a história, sem saber aonde ele vai dar, às cegas. Não acendo incensos. Para não afastar os fantasmas. Não posso ouvir música. Tenho de estar em silêncio. Todo concentrado para a palavra – uma vez que ela, repito, é o meu guia. Neste escuro, neste abismo e maravilha! Quando pego o ritmo, a voz do personagem. Quando sei que não mais o perderei de vista. Dou um breque. Uma paradinha e pego uma cerveja. Uma só, para não ficar bêbado. Não consigo escrever embriagado. Tudo em mim tem de estar ligado . Sóbrio e afinado. Para ouvir, sem intermediários e sem atrapalhos, o que eu tenho a dizer. Sempre cercado de dicionários. Palavras de todo tipo. Essa é minha ladainha. O resto, amigo, sai na purpurina. E tenho dito.”
Fonte: http://michellaub.wordpress.com (23/10/2012)
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