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Conselho literário
Sônia Coutinho

1. Leia o mais que puder. Leia os clássicos mas, principalmente, procure ler os contemporâneos. E sempre guiado pelo prazer - quando a leitura parecer pura obrigação, esqueça.

2. Em suas leituras, preste atenção a todo tipo de recurso narrativo que os outros escritores usam. Veja como mexem com estrutura, trama ou ausência " de trama, construção ou não de personagens, ponto de vista narrativo, etc Mas, quando for escrever seus próprios trabalhos, não pense em nada disso. O que vem de você, no momento de criar, tem de vir como se fosse inteiramente instintivo, intuitivo. (Aqui, recomendo um livrinho interessante, A arte cavalheiresca do arqueiro Zen, de Eugen Herrigel. Ele mostra como combinar  espontaneidade e elaboração.)

3. É útil saber o que os outros escritores pensam sobre seu oficio. Descubra o que eles dizem a respeito em entrevistas e depoimentos. Se possível, converse com muitos deles, mesmo que tenha de vencer uma natural tendência dos literatos  para a introversão e o isolamento.

4. Uma americana que dá oficinas literárias em Taos, Novo México, a Nathalie Goldberg, diz que a única maneira de fracassar, para quem escreve, é parar de escrever. É uma boa frase para lembrar nos maus momentos, quando a gente pensa chegou ao fim, que não tem mais editor e ninguém quer saber dos nossos escritos.

5. É bom, por outro lado, lembrar que temos o direito e, em certas circunstân­cias, o dever de parar de escrever. Rilke, em suas Cartas a um jovem poeta, aconselha: "Se você consegue viver sem escrever, não escreva".

6. Tenha em vista que há dois tipos de motivação para o escritor - a extrínseca e a intrínseca. A primeira, a extrínseca, gira em torno da busca de aceitação e sucesso. A segunda, a intrínseca, diz respeito à necessidade interior de escrever - e é esta que, mesmo diante do eventual insucesso, leva o escritor a continuar. A necessidade intrínseca é mais importante e confere dignidade - apóie-se nela.

7. Se puder, aprenda línguas estrangeiras, no mínimo duas. Leia autores estrangeiros no original. E você mesmo traduza poemas ou trechos de bons autores - é um excelente exercício.

8. Literatura não é atividade puramente de gabinete. O que oferece o maior aprendizado para o escritor iniciante é a própria vida. É preciso ir fundo na vida, e dar vazão às suas emoções pessoais. Pode haver risco nessa aventura, mas é um risco necessário. E vá fundo enquanto jovem. Mais tarde, pode ser impossível.

9. Viajar ajuda bastante. Candidate-se a bolsas, passe temporadas fora do Bra­sil. Viver dentro de uma cultura diferente aguça o senso de observação. E pode ser uma boa maneira de "ir fundo."             

10. Se você não tem condições, inclusive por motivos financeiros, de seguir estes preceitos, escreva, de qualquer forma, nem que seja a lápis, em momentos avulsos. E denuncie suas desvantagens.

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Fonte: Rascunho, nº 100, ago. 2008

Sonia Coutinho é autora de Lucrecia e O último verão de Copacabana, entre outros. Vive no Rio de Janeiro. 

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