12º Emprego
Cícero da Mata
Após o último emprego (CET), passei alguns perrengues. Foram 13 meses fora do mercado de trabalho com registro em carteira. Digamos que até foi bom para eu poder ver o mundo bibliográfico de outro ponto de vista: o ponto de vista do livreiro. Por um breve período, trabalhei na PTI-Publicações Técnicas Internacionais tentando vender assinaturas de revistas às bibliotecas. Como eu era conhecido no métier, devido ao envolvimento com a criação do Sindicato do Bibliotecários, seu proprietário Pierre me pegou para acompanhá-lo nas visitas que fazia às bibliotecas da USP e institutos de pesquisas.
Serviu também para mostrar que o meu talento para vendedor é algo que, talvez, não deva ser encorajado. Provou que eu sei (e gosto) vender apenas à quem quer comprar. Mas, para eu convencer o indivíduo a adquirir um produto é difícil. Convencer a adquirir um serviço torna-se mais difícil ainda. Não devo ter ficado nem dois meses na PTI. Minha amiga Miriam, que já havia me arrumado um emprego de professor na FATEA, em Santo André, conhecia Johnny Wollf, livreiro e filho dos proprietários da Livraria Canuto, e me indicou para uma conversa.
Trabalhei na Canuto durante 10 meses, e foi uma experiência salutar à profissão. Passei a conhecer melhor o diversificado mercado livreiro; as grandes editoras internacionais; o mercado de livros técnicos e alguns macetes da profissão de livreiro. Trabalhava junto ao Sr. Canuto (Knut), um velho alemão, livreiro experiente e diplomado na Europa. Aqui eu só vendia à um eventual cliente que vinha procurar um livro específico, e cada venda era o resultado de uma pesquisa nos catálogos. A Livraria Canuto só trabalha com livros técnicos importados, e não é dirigida ao público em geral.
Localizada no 2ª andar de um prédio na Rua da Consolação, atende mais as bibliotecas técnicas, empresas e instituições de pesquisas e, particularmente, órgãos públicos através de editais de concorrência. Meu trabalho, além de atender um ou outro cliente, consistia em fazer levantamentos bibliográficos, elaborar “folders” promocionais de algumas obras e “cotar” as imensas listas de livros pedidos. Revendo agora, vejo que o tempo passado na Canuto, além de ampliar meu conhecimento sobre livros, alargou meu horizonte profissional: não é só em biblioteca que o bibliotecário pode trabalhar. Maria Antonieta Ferraz, lendária professora da Escola de Biblioteconomia, gostava de falar disso e me pegar como exemplo.
Em agosto de 1981 fui socorrido, novamente, pela minha amiga Miriam. Ela conhecia Vicente, gerente do Departamento de Direitos Autorais da Editora Abril Cultural, uma parte da Editora Abril que ficou com Richard Civita após a morte do velho Vitor Civita. O Departamento mantinha um arquivo de fotos, independente da Biblioteca e precisava de uma pessoa para organizá-lo. Comecei a trabalhar no prédio da Marginal, mas logo mudamos para a Rua do Cortume, na Lapa. Em termos de convivência, foi um período interessante. O ambiente da Abril, em termos de estrutura administrativa era liberal, muito arejado e me proporcionou algumas amizades que mantenho até hoje. Depois do Metrô, foi o lugar onde mais fiz amigos.
Numa sexta-feira, em meados de 198?, eu junto com Vicente, Airton e outros colegas saímos para beber num bar nas proximidades da Av. Paulista após o expediente. Ficamos até umas 11hs. da noite, quando eu me retirei de motocicleta em direção ao bairro Paraíso, onde morava. Fui pela Alameda Santos até cruzar o Parque Trianon. No cruzamento com a Alameda Casa Branca fui atropelado por um carro que vinha da região dos jardins. A batida me arremessou por cima do carro, e fui atirado no asfalto. Por sorte fraturei apenas o joelho. Isto foi o que me contaram, pois não tenho lembrança alguma da colisão. Devo ter desmaiado na trombada e quando acordei já estava no hospital.
Feita a cirurgia com implante de ossos retirados da bacia e alguns “ferrinhos” fiquei internado no hospital por três dias. Os médicos determinaram um período de 90 dias para recuperação. A legislação trabalhista determina que num período longo como esse, o funcionário se desliga, temporiamente, do trabalho e passa a receber um salário menor pela Caixa Econômica Federal. Mas eu e Vicente fizemos um acordo para eu continuar fazendo alguns trabalhos em casa sem ser removido para a Caixa. Em seguida a Abril Cultural foi transferida para um prédio na Rua 13 de Maio, no bairro do Bexiga, onde o arquivo de fotos foi incorporado à Biblioteca, e eu passei a trabalhar no acervo de livros.
Coincidentemente o prédio da Abril ficava quase de frente à sede da CMTC-Companhia Municipal de Transportes Coletivos, onde Seishun era vice-presidente e Gilberto Lehfeld era Diretor de Desenvolvimento. Por diversas vezes nos cruzávamos na hora do almoço e conversávamos sobre o trabalho que andávamos fazendo. Numa dessas conversas, Seishun disse que a CMTC não uma biblioteca técnica; que precisava de uma e perguntou se eu não queria voltar a trabalhar nos transportes públicos. Eu respondi com a mesma pergunta que fiz anos antes noutra mudança de emprego promovida por ele: Mas é para agora ou para já? E assim surge o 13º emprego.
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