“Eu me considero um espírito religioso. Crer em Deus é uma expressão forte. Duvido muitas vezes disso, quando uma criancinha morre de fome. Estou muito perto do maniqueísmo, que explica a existência de dois deuses: Deus e o demônio, que nunca sei porque escrevem seu nome com letra minúscula, pois ele é bem mais ativo. Acho que o maniqueísmo contém uma grande verdade, se não as coisas não têm sentido. Como pode haver um Deus onisciente, onipresente e bondoso, e permitir que uma criancinha morra de fome, que mal faz ela? Santo Agostinho, nas Confissões, foi maniqueísta durante muitos anos, depois se arrependeu, disse que Deus dá liberdade absoluta aos homens para que façam o que quiserem, e se eles são castigados, é por sua própria culpa. Agora, eu me pergunto e pergunto a Rousseau – gostaria que ele estivesse aqui, nesta mesa-redonda -, que mal pode haver feito ao mundo uma criancinha de dois anos, para morrer com dores horríveis, ou com fome, ou de meningite, que agora está em moda na Argentina. Ou de cólera, posso citar uma teodicéia deste tamanho...”
Fonte: TV Cultura (SP), Programa Roda Viva, 12/09/1994
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