Volta para a capa
Bibliografia
Por que escrevo?

1851

01 - SCHOPENHAUER, Arhur. Sobre o ofício de escritor. São Paulo: Martins Fontes. 2005.

Por uma ironia da história, iniciamos esta bibliografia com um dos mais recentes e o mais antigo livro publicado sobre o assunto. A explicação está no fato de o livro ser publicado originalmente em 1851, embutido na obra Parerga e Paraliponema. e somente agora destacados do volume e “repropostos autonomamente em virtude de sua unidade e coerência temática”. O que faz um livro merecer esta distinção após mais de 150 anos de editado? Sem dúvida, a permanência da atualidade e sua necessidade nos dias de hoje. A Internet – com seus meios e e-mails – vem despertando um interesse maior pelo conhecimento da escrita. Basta ver o número de livros lançados nos últimos anos sobre o estudo e ensino da escrita, seja literária ou não. O livro reúne três textos, cujo primeiro e mais longo dá título à obra. Os outros dois – Da leitura e dos livros  e Da língua e das palavras -  constituem-se em curtos ensaios para complementar o tema  da escrita. Para o filósofo existem dois tipos de escritores: os que escrevem por amor, porque têm o que dizer e necessitam dize-lo; e os que escrevem por escrever, por amor ao dinheiro que a escrita lhe proporciona. Não precisa dizer que estes últimos não valem a pena serem lidos. Assim, faz uma crítica implacável à mediocrização da literatura, que se transformou num conluio entre escritores e editores para iludir o público e, com isto, ganharem a vida. Os termos pejorativos utilizados para atacar os comerciantes das letras são contundentes e dão uma idéia precisa de sua ira contra a mediocridade, a estupidez, a ignorância e, particularmente, contra a falsa inteligência, a arrogância da boçalidade. Julio Daio Borges acerta quando diz que se Schopenhauer vivesse nos dias de hoje, “possivelmente se atiraria da ponte ou mandaria cortar a mão”, tal a atualidade suas críticas. Na sua opinião -de filósofo e escritor, que se considerava – o valor de um livro reside na “matéria” (temática) ou na “forma” como o tema foi desenvolvido. Pessoas comuns e superficiais podem, graças ao conhecimento da matéria, escrever livros (de história, viagens, técnicas etc.) muito importantes. Por outro lado, quando o que importa é a “forma”, uma vez que a matéria já conhecida, apenas “uma mente excelente é capaz de oferecer algo digno de ser lido”. No entanto, o público dedica seu interesse  muito mais à “matéria” do que à “forma”, provocando um atraso em sua formação superior. “Entregue a esse péssimo pendor público, a iniciativa de produzir algum efeito por meio da ’matéria’ torna-se absolutamente condenável nas áreas em que o mérito deve residir expressamente na ‘forma’“. Como forma de coibir a péssima literatura, ele sugere que “as revistas literárias deveriam ser um dique contra a escrevinhação inescrupulosa do nosso tempo” e a quantidade crescente de livros inúteis e ruins. Mas, as recensões são feitas no interesse dos editores venderem mais livros, fechando o citado conluio entre escritores e editores. Parece que naquela época, como em parte ainda hoje, era comum o resenhista não colocar seu nome ou esconde-lo atrás de um pseudônimo. São críticos muito complacentes, que fogem de sua missão de avaliar uma obra literária, pois, “para aquele a quem nada é ruim, nada é igualmente bom”. Quanto ao anonimato, ele vocifera: “Nomeia-te velhaco! Pois quem é honesto não ataca sob máscara e capuz pessoas que passeiam com a face descoberta”, e emenda: “todo homem honesto deve por seu nome no que escreve”. Uma das características do bem escrever se encontra no estilo. Mas o que é isso? “O estilo é a fisionomia do espírito”, é o modo “como” a pessoa  pensa. “Seu estilo é uma impressão exata desse ‘como’, dessa propriedade essencial e dessa ‘qualidade’ universal do pensar”. Adverte para que um autor deve resguardar-se de querer mostrar mais espírito do que possui, e afirma que a “ primeira regra do bom estilo é a de ter algo a dizer”. Mais a frente o conselho é reforçado: “Quem tem algo a dizer que valha a pena ser dito não precisa esconde-lo por trás de preciosismos, frases difíceis e alusões obscuras”. Outras dicas sobre estilo: “Alguém que tenha algo correto a dizer se esforçará por exprimi-lo de maneira indistinta ou distinta?”; “Toda palavra supérflua acaba agindo contra sua própria finalidade”; “Dizer muitas palavras para comunicar poucas idéias é sempre um sinal inequívoco de mediocridade”. Tais dicas estão em plena concordância com Antonio Albalat (Ref. 07). Ambos são enfáticos na defesa do estilo claro, sem rodeios. Em seguida passa a citar diversos exemplos de palavras mal empregadas e erros gramaticais praticados  pelos jornais e revistas da época, e chega a sugerir que o Estado deveria cuidar para que os  jornais fossem totalmente irrepreensíveis do ponto de vista lingüístico. Não obstante toda a contribuição que Schopenhauer presta ao oficio do escritor, não se pode perder de vista a perspectiva histórica; levar em conta a época em que suas observações foram feitas, bem como o pensamento elitista do filósofo. Porém, muitas das suas observações continuam atuais e alguns vícios e abusos só têm aumentado ao longo destes anos.       

1893

02 - ALENCAR, José de. Como e por que sou romancista. Porto Alegre:  Mercado Aberto, 1998. (1ª ed. Tipografia de G.Leuzinger & Filhos, 1893)

Caso esta pesquisa, incluindo os depoimentos da primeira parte, não pudesse ser chamada, também, pelo pomposo título: “Confessionário das origens idiossincráticas dos escritores”, este livrinho não estaria aqui resumido. Pois não traz de modo algum as respostas aludidas no título. José de Alencar não diz de modo claro e explícito “como” e menos ainda “por que” e como se tornou romancista. O que existe de fato são relatos das “circunstâncias a que atribuo a predileção de meu espírito pela forma do romance”. O livro, escrito na forma de carta, foi denominado pelo autor como uma “autobiografia literária”, que  tem inicio em 1840, quando  contava com 11 anos. Freqüentava o Colégio de Instrução Elementar e mantinha uma profunda admiração pelo Diretor, “o primeiro homem que me incutiu respeito, em quem acatei o símbolo da autoridade”. Por essa época, o menino mantinha em casa o título de “ledor da família”. Sua mãe, sozinha ou em reunião com as tias, sempre o convocava para leituras e foi “essa leitura contínua e repetida de novelas e romances que primeiro imprimiu em meu espírito a tendência para essa forma literária que é entre todas a minha predileção? Não me animo a resolver esta questão, mas creio que ninguém contestará a influência das primeiras impressões”.  Por volta de 1843, vai morar em São Paulo afim de se matricular no curso jurídico. Na bagagem levava alguns cadernos contendo fragmentos de romances, divididos em dois moldes: melancólico e pitoresco. Instala-se numa república de estudantes, onde mantém contatos com os admiradores de Joaquim Manoel de Macedo, que acabara de lançar A Moreninha. A escassez de livrarias na época levou-o a freqüentar a biblioteca particular de Francisco Octaviano, conhecido de seus amigos. Aí teve contato com a literatura francesa, e “vi pela primeira vez o volume das obras completas de Balzac”. Lia em francês com muita dificuldade, armado do dicionário e “tropeçando a cada instante, buscando significados de palavra em palavra”. Ao longo de um ano, toma contato com Alexandre Dumas, Chateaubriand e Victor Hugo, além de Balzac. Em 1845, sentiu desejo de escrever alguma literatura, mas nessa época  Byron predominava na juventude paulistana. “Todo estudante de alguma imaginação queria ser um Byron; e tinha por destino inexorável copiar ou traduzir o bardo inglês”. Porém, o autor não sentia o menor jeito para trilhar esse caminho, “talvez pelo meu gênio taciturno e concentrado, que já tinha em si melancolia de sobejo para não carecer desse empréstimo”. Assim é que nesta época dedica-se mais à imprensa, mesmo não apreciando a política como seu pai – “Eu saía de uma família para quem a política era uma religião” – que chegou a senador. “Foi somente em 1948 que ressurgiu em mim a veia do romance”. Influenciado pelos romances marítimos de Walter Scott e James Fenimore Cooper, escreveu Os Contrabandistas, que abrangia vários gêneros, desde o idílio até a epopéia. Neste livro trabalhava não pela ordem dos capítulos, mas algumas partes em que se dividia  a obra e “conforme a disposição do espírito e a veia da imaginação, buscava entre tosos o episódio que mais se moldava às idéias do momento. Mas o livro não foi publicado, pois um “desalmado hóspede” utilizou-se das folhas de papel para acender o cachimbo toda vez que dava vontade de pitar. O primeiro livro foi  Cinco Minutos, escrito em 1957, enquanto era redator-chefe do Diário do Rio de Janeiro. O livro foi escrito em capítulos diários na forma de folhetim, com a finalidade de oferecer aos leitores um “mimo de festa”. Após editado foi distribuído apenas aos assinantes do jornal. No entanto, algumas pessoas insistiam em comprá-lo. Logo, o livro tinha leitores espontâneos, não iludidos por falsos anúncios, e isso “bastou para suster a minha natural perseverança. Em seguida, publicou Viuvinha e O Guarani, sempre na forma de folhetim publicado em capítulos no jornal.  O Guarani foi um sucesso de público, mas a crítica literária ignorou-o. No lançamento (1857) o livro custava 2$000 (dois mil réis) e dois anos depois podia-se comprá-lo por 5$000 nos alfarrábios, certificando o autor de ter criado  um  romance  autenticamente  brasileiro. Em 1862 publicou, por conta própria, Lucíola,  que também foi ignorado pela crítica e aplaudido pelo público. Logo depois, Quintino Bocaiúva criou a “Biblioteca Brasileira” e pediu ao autor que ocupasse um de seus volumes. Daí surgiu As Minas de Prata em 5 volumes. Em 1865 deixa “a existência descuidadosa  e solteira para entrar na vida familiar”, e neste mesmo ano publica Iracema, se segundo sucesso literário. machado de Assis chegou a elogia-lo “numa de suas mais elegantes revistas bibliográficas”. O livro chegou até Portugal, onde o escritor Pinheiro Chagas dedicou-lhe um de seus ensaios críticos. Em 1868 “a alta política arrebatou-me às letras”. Neste ano o autor é nomeado Ministro da Justiça, mas seu ingresso na política havia se dado bem antes, em 1861 como deputado pelo Partido Conservador. em 1869 candidata-se ao Senado, porém seu nome é vetado pelo Imperador Dom Pedro II. Ao longo de sua vida de romancista, sempre critico os tipógrafos e editores pela falta de profissionalismo. Só em 1870 é que encontrou na Livraria Garnier um editor que pudesse centralizar as edições de toda sua obra. 

1907

03 - RILKE, Rainer Maria. Cartas a um jovem poeta. São Paulo: Hemus, 1967.

Este pequeno clássico, além das orientações literárias e de vida, nos dá um retrato fiel do grande poeta. Conforme esclarece Fernando Jorge na introdução, “em tais cartas se evidencia a poderosa e magnética personalidade de Rilke”. São dez cartas dirigidas a um tal  Franz Xaver Kappus entre 1903 e 1908. A questão “por que escrever?” desponta já na primeira carta. Para ele esta questão só tem um caminho: “penetre em si mesmo e procure a necessidade que o faz escrever. Observe se esta necessidade tem raízes nas profundezas do seu coração. Confesse à sua alma: morreria, se não me fosse permitido escrever?”. Mais a frente é reiterado: ”faça a si esta pergunta: sou de fato obrigado a escrever? Examine-a a fundo até achar a mais profunda resposta “. Antes de concluir a carta, mais uma reiteração: “mergulhe em si próprio e sonde as profundidades de onde jorra a sua vida. Só desta maneira encontrará resposta à pergunta: Devo criar?”. E concluindo acrescenta entre parêntesis: “Basta, no meu entender, sentir que se poderia viver sem escrever para não mais se ter o direito de fazê-lo”. Tudo leva a crer que Borges teve conhecimento desta questão ao afirmar “no puedo no escribir”. Mas foi Clarice Lispector quem afirmou com todas a letras se não lhe fosse permitido escrever: “eu me morreria simbolicamente todos os dias”. (Ref. 12)  O restante das cartas resumem-se em lições de vida, impressões do mundo e conselhos úteis  ao seu discípulo. Adverte-o para os perigos da ironia, onde o conselho é curto e grosso: “Desça ao âmago: a ironia não vai até lá”, bem como orienta-o a ler “o menor número possível de trabalhos críticos ou estéticos”. Tais leituras não têm relevância alguma, pois são textos imbuídos de espírito partidário  ou “hábeis  jogos verbais, inspirados numa opinião, agora, e no dia seguinte, em opinião contrária”.  Para concluir, apresenta uma série de reflexões, orientando-o no que considera as principais coisas da vida, resumidas a seguir:  Amor - “O amor de um ser humano por outro, é  talvez a experiência mais difícil para cada um de nós, o mais superior testemunho de nós próprios, a obra absoluta em face da qual todas as outras são apenas ensaio”. Solidão - “O homem solitário pode desde já  lançar as bases, construir o futuro com as suas próprias mãos que  se  iludem menos”,  ou “que seria uma solidão que não fosse uma grande solidão. Uma só coisa é necessária; a solidão, a grande solidão íntima”. Dúvidas - “Esforce-se por amar as suas próprias dúvidas... se a educar, poderá tornar-se uma coisa sadia; isto é, transformar-se em instrumento de saber e de seleção”. Religião - Sendo Deus a perfeição, não acha que dever ser antecedido de realizações menores para que possa  retirar a sua substância da plenitude e da fartura? Não acha que deve vir depois de tudo – para conter tudo?            

1919

04 - BRETON, André. Pourquoi écrivez-vous? Litterature, nº 9, 10, 11. Paris. 1919

O autor, obcecado pelos mistérios da criação literária, sempre questionou o ato de escrever, incitou rupturas e propôs todo tipo de subversão às belas letras. Ao fundar a revista “Litterature”, em março de 1919, junto com Louis Aragon e Philippe Soupault decidiu concretizar um desejo: investigar a motivação de seus colegas surrealistas com a pergunta “por que você escreve?”. Defensor de uma arte do inconsciente, sem direito a grandes depurações, achava que “o escritor será capaz de responder à queima-roupa a uma pergunta bem simples”. Obteve 83 respostas de romancistas e poetas e publicou-as em três números da revista. Dos nomes mais conhecidos, destacam-se Paul Eluard, André Gide, Blaise Cendras e Paul Valéry. Trata-se do primeiro grande levantamento de respostas à questão, que mais tarde teve continuidade com a enquete realizada pelos editores do jornal parisiense “Libération” (Ref. 13) reunindo mais de 400 respostas. Em 6 de outubro de 2001, a jornalista Luciana Hidalgo escreveu uma matéria, publicada no caderno Verso & Prosa d`O Globo, sobre o levantamento de Breton, e reviveu a curiosa pergunta fazendo-a à seis escritores brasileiros: Ferreira Gullar, Lya Luft, Antônio Torres, Moacyr Scliar, Alexei Bueno e Ivan Junqueira.      

1946

05 - ORWELL, George. Por que escrevo. In: Dentro da baleia e outros ensaios. Organização de Daniel Piza. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

 “Desde a mais tenra idade, talvez desde os cinco ou seis anos, eu sabia que, quando crescesse, seria um escritor”. É a primeira frase deste ensaio publicado em 1946. Seu primeiro poema foi ditado aos quatro ou cinco anos à sua mãe, que o escreveu. Aos 11 anos, quando iniciava a I Guerra Mundial, escreveu um poema patriótico publicado no jornal local; aos 14 escreveu uma peça rimada – imitando Aristófanes – ao mesmo tempo em que editava revistas da escola. Escrevia versos para ocasiões especiais e poemas semicômicos numa velocidade espantosa. Ele achava que “estava fazendo um exercício literário de um tipo diferente: “a invenção de    uma contínua ‘história’ sobre mim mesmo, um tipo de diário que existia somente na minha cabeça”. Tal sentimento convivia com o hábito de descrever minuciosamente as coisas e situações e o desejo de encontrar as palavras certas. “Embora eu tivesse que procurar, e procurava, as palavras certas, eu parecia estar fazendo estes esforços descritivos quase contra minha vontade, sob uma espécie de compulsão vinda de fora”. Esse comportamento levou-o ao desejo de “escrever enormes romances naturalistas com finais felizes, cheios de detalhadas descrições e sorrisos encantadores, e também cheios de ornamentos retóricos em que as palavras fossem usadas parcialmente pelo prazer de usar a palavra”.  De fato, seu primeiro livro – Dias na Birmânia – escrito aos 30 anos, refletiu exatamente isto. O ensaio, escrito na forma de confessionário, traz estas informações de fundo “porque não acho que alguém pode penetrar nos motivos de um escritor sem saber alguma coisa de seu desenvolvimento anterior”, para em seguida descrever os motivos que levam uma pessoa a escrever, colocando de lado a necessidade de ganhar a vida. Os motivos são quatro e “existem em diferentes graus em cada escritor e as suas proporções variam de tempo em tempo, de acordo com a atmosfera em que ele está vivendo: 1) Completo egoísmo, o desejo de parecer esperto, de ser comentado, lembrado após a morte etc. Os escritores compartem esta característica com cientistas, artistas, políticos, advogados, negociantes bem sucedidos – em suma, com toda a camada superior humanidade. A maioria das pessoas não é agudamente egoísta. Depois dos 30 anos, a maioria quase abandona o sentido de serem pessoas individuais e vivem principalmente para os outros, ou são sufocadas por trabalhos enfadonhos. Porém, há uma minoria de pessoas talentosas, voluntariosas, dispostas a viverem suas próprias vidas até o fim. Os escritores estão nesta classe. “Os escritores sérios, eu tenho que admitir, são ainda mais vaidosos e egocêntricos que os jornalistas, embora sejam menos interessados em dinheiro”. 2) Entusiasmo estético, “a  percepção da beleza no mundo exterior ou, por outro lado, nas palavras e no seu arranjo correto. O prazer do impacto de um som no outro, na firmeza da boa prosa e do ritmo de uma boa história. O desejo de compartir uma experiência que se sente que é valiosa e não deveria ser perdida. O motivo estético é muito fraco em uma porção de escritores”. Mas, qualquer escritor “tem palavras e frases preferidas que lhe apelam por razões não utilitárias... nenhum livro está livre de considerações estéticas”. 3) Impulso histórico, “o desejo de ver as coisas como elas são, de descobrir os fatos verdadeiros, de guardá-los para a posteridade”. 4) Propósito político, no sentido amplo da palavra “político”. O desejo de modificar o mundo, de alterar uma realidade e a idéia de outras pessoas sobre um tipo de sociedade. “Nenhum livro é genuinamente livre de preconceito político. A percepção de que a arte não deveria ter nada a ver com a política é, em si mesma, uma atitude política”. O autor declara ser uma pessoa “na qual os três primeiros motivos seriam mais fortes que o quarto” e acrescenta “em uma época de paz, eu talvez tivesse escrito livros ornamentais ... e teria permanecido quase descuidado de minhas lealdades políticas”. Mas sua vida decorreu de modo diverso. Ainda jovem passa cinco anos como policial do Império Britânico, na Índia, conhecendo o imperialismo por dentro; mais tarde enfrenta a extrema pobreza vagueando pelas ruas de Londres e Paris; em seguida vieram Hitler e a Guerra Civil Espanhola, da qual participou ativamente. A partir daí “eu sabia quais eram minhas opiniões... cada linha de trabalho sério que eu escrevi desde 1936 foi feita, direta ou indiretamente contra o totalitarismo e a favor do socialismo democrático, como eu o entendo”. Dito isto, a motivação para escrever foi sempre um sentimento de engajamento político, um senso de injustiça a ser denunciada”. É desse modo que se cristaliza o escritor político, corroborado pela afirmação: “o que eu mais quis fazer nos últimos dez anos foi transformar a escrita política em arte. Nesta afirmação está visto a primazia da arte e o esforço em lhe dar um encaminhamento político. Esta diretriz fica melhor exposta ao final do ensaio quando diz: “Relendo as últimas duas páginas, vejo que fiz parecer que os meus motivos para escrever eram todos de espírito completamente públicos, para o bem comum. Mas eu não quero que esta seja a impressão final”. Explica que todos os escritores são vaidosos, egoístas e preguiçosos e que “há um mistério no fundo dos seus motivos”. Escrever não é fácil, é uma “luta horrível e cansativa... Ninguém embarcaria em tal jornada se não fosse impulsionado por algum demônio que ele não pode resistir nem entender”. Concluindo seu “testamento literário político”, declara não ter certeza quais dos motivos que o levaram a escrever são os mais fortes, “mas sei quais deles merecem ser seguidos. E, olhando para trabalho que já fiz, vejo que é invariavelmente onde eu não tinha um propósito político que escrevi livros sem vida e fui tragado por passagens excessivamente ornamentadas, sentenças sem significado, adjetivos decorativos e, de maneira geral, tolices”.   

1948

06 - SARTRE, Jean-Paul. ¿Por que escribir? In: ¿Que es la literatura? Buenos Aires: Editorial Losada, 1950.

A obra representa, no conjunto, o mergulho mais fundo na questão refletida por um filósofo e escritor reconhecido nas duas áreas. O capítulo em vista é o 2º do livro e investiga a questão - Por que escrever? - em 20 páginas; o capítulo anterior analisa detalhadamente em 23 páginas “O que é escrever?”; o capítulo posterior interroga “Para quem se escreve?” em 65 páginas. Quantidade em termos de informação e conhecimento, contribui para a qualidade, ainda mais se tratando de uma contribuição dessa. É interessante registrar que Sartre publicou o livro em 1948, mesmo ano em que João Gaspar Simões (Ref. 07) publicava sua reflexão sobre as mesmas questões, formuladas nos mesmos moldes. Não sabemos se um tinha conhecimento do que outro estava pensando (e escrevendo) sobre o ato de escrever, o fato é que os dois pensaram mais pausadamente sobre a questão ao mesmo tempo, de modo diverso, literária e filosoficamente. Partindo do princípio que a arte é uma fuga para alguns, e para outros é um modo de conquista ou encontro, a pergunta de Sartre é objetiva: “Por que precisamente escrever, fazer por escrito essas evasões e conquistas?” Trata-se de um célebre ensaio, como bem disse Fábio Lucas (Ref.13), onde Sartre “tratou do assunto com vigor filosófico”. Daí minha dificuldade na compreensão e resumo das 20 páginas numa só, para informar corretamente o conteúdo do texto. Após algumas tentativas, verifiquei que a síntese do ensaio feita por Fábio Lucas é perfeita para o que se propõe. Assim, vali-me de seu texto destacado a seguir, com as citações de Sartre entre aspas: A seu ver (Sartre), “todas as obras do espírito contêm em si a imagem do leitor a que são destinadas”. A obra literária, assim, é uma causa potencial de experiência, passa a existir apenas na leitura. O objeto literário, para Sartre, constitui um estranho pião, que só existe em movimento. “Para fazê-lo surgir, é necessário um ato concreto que se chama leitura e somente dura enquanto essa leitura pode durar”. Deste modo, escrever para si mesmo seria o pior fracasso. “O ato criador não passa de um momento incompleto e abstrato da produção de uma obra; se o autor existisse só, ele poderia escrever enquanto desejasse, jamais a obra como ‘objeto’ viria à luz e seria necessário que depusesse a pena ou desesperasse. Mas, a operação de escrever implica a de ler como seu correlato dialético”. Segundo o filósofo existencialista, o leitor tem consciência de desvelar e de criar ao mesmo tempo, de desvelar criando, de criar por desvelamento. Em síntese: “a leitura é criação dirigida”. Prosseguindo no resumo do pensamento, diz ele adiante: “Porque a criação só pode encontrar seu acabamento na leitura, porque o artista deve confiar a outro a tarefa de concluir o que ele começou, porque somente através da consciência é que ele pode ter como essencial a sua obra, toda obra literária é um apelo. Escrever é apelar ao leitor para que ele faça passar à existência objetiva o descobrimento que empreendi por meio da linguagem”. Por isso, Sartre contesta a concepção kantiana da obra de arte como “finalidade sem fim”. É que a obra é um fim. Kant supõe que a obra exista de fato antes, e que é vista depois. Para Sartre, ela existe quando é vista, “é inicialmente puro apelo, pura exigência de existir”. Prosseguindo a meditar sobre a atividade criadora da leitura, Sartre mostra que “a leitura é um sonho livre”. E passa a demonstrar como ética e estética se conjugam: “Não se escreve para escravos. A arte da prosa é solidária do único regime em que a prosa guarda um sentido: a democracia. Quando uma é ameaçada, a outra também o é”. Em conclusão, “escrever é um certo modo de querer a liberdade”.

07 - SIMÕES, João Gaspar. Para que escrevem, Por que escrevem, Para quem escrevem os Escritores? In: Novos temas , Velhos temas: Ensaios de literatura e estética literária. Lisboa: Portugalia Editora, 1967.

Curiosamente no mesmo ano (1948) em que Sartre escreve um discurso filosófico sobre a pergunta, João Gaspar Simões escreve outro literário e consegue antecipar em quase 50 anos a visão, agora psicanalítica, de Cathérine Millot (Ref.16), mesmo discordando dessa visão: escrever literariamente é uma experiência mística. Antes de chegar aí, o autor fala dos “problemas acerca dos quais é tanto mais fácil tomar posições quanto mais difícil se torna achar para eles uma solução definitiva”. Tal é o caso do “problema que se põe quando a crítica pergunta se o escritor escreve para si mesmo ou para o público”. Discorre sobre o papel histórico do romantismo ao propor “uma espécie de culto dos valores literários fechados ou esotéricos”. Segundo essa visão, a literatura é “uma forma mística de revelação individual, quem escreve é para si mesmo que escreve, indiferente àqueles que o possam vir a ler”. Tal posição levada a esse extremo, revela a falsidade dessa visão. É evidente que “nem o escritor pode escrever sem o público, nem o público existe sem o escritor”. Para quem acha que a literatura é um instrumento de difusão de idéias, está claro que o escritor “é um intérprete de um estado de espírito protestativo e que sua missão não passa de subsidiária”. Trata-se de uma posição que anula completamente o escritor como ser autônomo. Parece claro que o “dom de escrever é ainda uma faculdade de comunicação, mas não há dúvida de que o elemento ‘necessidade’, o factor primeiro mercê do qual ele foi levado a escrever, já não influi directamente na sua atitude de escritor”. Não se pode dizer que os escritos do jovem Flaubert foram originados a partir de uma consciência social. Logo, o que conclui deste fato é que “conscientes de seu papel social ou inconscientes dele, os verdadeiros escritores são exactamente aqueles que conseguem repetir a cada momento, ao longo de sua vida literária, o estado de espírito da criança Flaubert: escrever por escrever, escrever para exprimir sentimentos e estados de espírito que se lhes impõe como necessitados de uma fixação”. Não se pode dizer que um poeta como Victor Hugo, ou um romancista como Émile Zola, ou um contista como Guy de Maupassant “estavam possuídos de um alto sentido social quando pegavam na pena”. O autor encerra sua análise com uma crítica aos tempos atuais, onde “a análise está perdendo os seus créditos e é no conceito sintético que os críticos e os filósofos baseiam as suas observações sobre o fenômeno humano”. Dessa maneira, “tudo quanto eu tenho estado a dizer é desmentido por aqueles que se recusam a separar no escritor o gesto pelo qual ele escreve da própria obra escrita”. Tais pessoas não admitem a “idéia de um escritor abstracto ou absoluto, ou seja de um escritor que escreve apenas porque nasceu escritor...”

1953

08 - ALBALAT, Antonio. A Arte de Escrever: Ensinada em Vinte Lições. 9ed. Lisboa: Livraria Clássica Editora, 1953

O título dá a idéia de um curso barato de literatura escrito em Portugal. Não é isto. Trata-se de uma tradução da 16ª edição francesa. Também não são apenas lições. São verdadeiras aulas ou conferências sobre questões fundamentais da literatura dispostas em quase 300 páginas, o que dá uma média de 15 páginas por lição. Mas as lições sobre estilo (concisão, originalidade, harmonia) ocupam mais de 100 páginas. É quase um tratado. É  preciso ver que tais lições serviram para uma literatura que se fazia há 50 anos e que, portanto, muitas mudanças ocorreram na forma de se fazer literatura. O que se ressalta aqui é a honestidade do ensino que se empreendeu. As outras lições não são menos importantes: narração, descrição, invenção, criação de imagens, observação direta e indireta, elocução, etc. Para o autor, o ensino do estilo consiste numa demonstração da arte de escrever, e não poderia ser diferente para quem acha que estilo “não é somente o dom de exprimir os nossos pensamentos, é a arte de os tirar do nada, de os fazer nascer, de ver as suas relações, é a arte de os fecundar e de os evidenciar”. Já no prefácio fica clara sua intenção: “Tenho lido quase todos os manuais e os cursos de literatura. São bons guias, mas nenhum ensina, técnica e praticamente a arte de escrever. Nenhum fez ainda as demonstrações de estilo. É uma lacuna que eu procurei preencher”. Em seguida ele reforça o propósito: “Meu alvo é ensinar no que consiste a arte de escrever; decompor os processos de estilo; expor tecnicamente a arte da composição; ministrar os  meios de aumentar e ampliar as aptidões do estudioso, isto é, duplicar-lhe e treplicar-lhe o talento; numa palavra, ensinar a escrever quem que não o saiba, mas que tenha o que é preciso para o saber”. (grifos do autor). As demonstrações de estilo, ou seja, de como pode se escrever melhor, mais limpo, conciso permeiam todo o livro. São diversos textos apresentados lado a lado com as palavras em excesso gravadas em italic, mostrando ao aprendiz o que pode ser suprimido melhorando o texto. Neste particular, é louvada a regra básica do jornalismo: “não diga em três palavras o que pode ser dito em duas, e melhor ainda numa só”. O autor dá o nome de “refundição” ao processo de limpeza de um texto e dedica-lhe toda a 12ª lição com exemplos de um texto escrito de três modos, cada qual mais enxuto e de agradável leitura sem perder nada do conteúdo transmitido. Está visto sua ojeriza aos lugares comuns e expressões triviais utilizadas com mais ou menos freqüência pelos autores, chegando mesmo a elaborar uma lista daquelas mais freqüentes e a proposição de frases alternativas. A última lição aborda o estilo epistolar, salientando que é inútil ensinar a escrever uma carta sobre um assunto que não se sente.  

A carta expressa um sentimento individual e neste aspecto as mulheres são imbatíveis, levando o autor a declarar “É inútil ensinar-se às mulheres o estilo epistolar; sabem-no por instinto e elas é que no-lo poderiam ensinar” e citar La Bruyère: “Este sexo vai mais longe do que nós nesse gênero de escrever. As mulheres ao pegar na pena, encontram rodeios e expressões, que muitas vezes, em nós, são efeitos de um longo e aturado trabalho”    

1954

09 - ANJOS, Cyro dos. A criação literária. Coimbra: Tipografia da Atlântida. 1954 (separata da Revista Filosófica, ano IV, nº 12) 

Após uma de suas aulas de literatura na Faculdade de Filosofia da UFMG, o autor foi intimado por um aluno impertinente a responder “por que escreve? Mais ainda, foi solicitado à dar uma aula sobre motivação literária. Para isto empreendeu uma pesquisa, não imaginando “que o tema vinha alimentado imemorial controvérsia entre estetas, psicólogos e artistas de todos os tempos”. A pesquisa  resultou neste livreto contendo um amplo painel das teses, opiniões e idéias de diversos autores sobre a criação literária e o sub-título da obra - “notas de leitura” - já indica essa intenção. São analisados os principais autores conhecidos na época: Felicien Charllaye (arte como jogo, entretenimento, aproveitamento de coisas que transbordam); Huizinga (criador do “homo ludens”, defensor moderno da teoria do jogo); Delacroix (psicólogo que refuta Huizinga, pois a arte está além do jogo e transcende o conceito de trabalho; Adler (sentimento nato de insegurança e inferioridade impele o ser humano às altas realizações); Ernst Meumann (defende um tratamento científico dado a questão, o aspecto fisiológico da criação artística e a existência de um instinto estético, idéia defendida por Grosse); Ribot (refuta a existência de tal instinto e defende um revivescimento espontâneo de imagens que se agrupam em combinações novas); Adriano Tilgher (conceito de arte como libertação das paixões, idéia defendida também por Goethe e Dostoievsky); Charles Lalo (atualiza o conceito de Aristóteles, para quem arte é purgação); Alceu Amoroso Lima (considera a criação artística um mistério impenetrável e o espírito criador um dom divino. Neste ponto, o pensamento do autor se alinha com João Gaspar Simões [Ref. 07] e Cathérine Millot [Ref. 14]); Jacques e Raissa Maritain (a obra de arte é um objeto e um sinal ao mesmo tempo); Bergson (defende a existência de uma função fabuladora, intensificada nos romancistas e dramaturgos, necessária para a manutenção do liame social, ameaçado pela inteligência); Benedetto Croce (arte é visão ou intuição lírica, é conhecimento sensível, e não conhecimento inteligível); Dilthey (a arte destina-se a satisfazer nossa necessidade de emoções); Elie Faure (a atividade estética é de natureza vital, corresponde a profunda necessidade de caráter biológico;  André Maurois (a arte consiste no emolduramento do real); Adolphe Portmann (a obra de arte atinge sua plenitude no concurso de nossas faculdades – instinto, razão, emoção, saber, etc. – não na separação delas, é preciso restabelecer o equilíbrio entre a função teórica e a estética); Jean-Paul Sartre (o conceito de literatura está envolto na idéia de”engagement”, o escritor não pode ser imparcial, exceção concedida em parte ao poeta, a função do escritor é fazer com que ninguém ignore o mundo) (Ref. 06) Eduardo Sprangler (defende a existência do “homo aestheticus”, um ser desinteressado que se diferencia do homem teórico, econômico ou religioso, um ser que transforma suas impressões em expressões). Depois de analisar tantos autores e ideías semelhantes ou contrapostas, Cyro do Anjos confessa-se vencido pela fadiga: “caminhei muito e não progredi sequer um milímetro’”. Para fechar o ensaio, recorre a Pirandello, que também faz sua contribuição ao debate sobre a criação literária: “Que autor poderá dizer como e porque um personagem nasceu em sua fantasia? O mistério da criação artística é idêntico ao do nascimento natural”.            

1961

10 - BUENO, Francisco da Silveira. A Arte de Escrever. São Paulo: Saraiva, 1961.

O prof. Silveira Bueno - “no convívio cotidiano e superiormente adorável da mocidade observando bem de perto os anseios dos que sentem asas nos ombros sem saber como atingir as alturas do ideal literário, veio-nos a idéia de escrever-lhes um livro, que lhes servisse de guia nessa entramada senda intelectual” - atingiu plenamente o objetivo. Seu 

livro foi um dos mais lidos no gênero, chegando a atingir a 10ª edição. Trata-se de um manual prático, fiel seguidor dos preceitos americanos, em detrimento dos manuais franceses, conforme ressaltado pelo autor: “Refletem a maneira francesa antiga, teóricos em excesso e parcamente práticos”. Tal praticidade levou-o a não incluir a composição poética em seu manual, “pela razão de andarem os cânones da poesia muito incertos... é que a poesia é luxo e a prosa, necessidade”. Quanto a possibilidade de se ensinar a escrever, o autor é objetivo: “Certamente sim. A literatura é arte; a arte é hábito aperfeiçoado no seu máximo grau; o hábito adquire-se pela repetição inteligente e sentida dos mesmos atos”. O livro foi concebido após um longo período de experiência do autor como [professor de literatura. Após concluído, quando dava aula no Colégio Mackenzie, passou por uma revisão completa de que durou dois anos e teve incluído os ensinamentos de autores e tratadistas da língua inglesa. O cuidado com a obra revela-se, também, na organização editorial. Além do índice analítico, que sinaliza a contento os temas tratados, o livro é dividido em onze capítulos, entremeados com diversos exercícios, garantindo o citado aspecto prático. “Precisamos fazer e não somente dizer com se faz. Neste livro procuramos aliar as duas coisas: dizer como se faz e fazer”. Esta intenção já foi melhor explorada por Antonio Albalat em 1953 (Ref. 08).  Cada capítulo sem título engloba uma série de temas dispostos em breves verbetes, lembrando uma enciclopédia: assunto (escolha do), esquemas, expressão, composição, ênfase, habilidade na escrita, coerência, síntese,  explanação, sentença, estilo, preciosismo, narração, harmonia, repetição, afetação, clareza, simplicidade, alegoria, crítica literária, romance, biografia, cartas, entrevista, ensaio, conto, crônica etc, etc, etc.            

1967

11 - MOISÉS, Massaud. A Criação Literária. São Paulo: Melhoramentos. 1967

Nosso conhecido professor de literatura nos dá uma lição de humildade e competência já na denominação do título do livro que vinha fazendo desde 1952, quando iniciou na Cadeira de Literatura Portuguesa na USP-Universidade de São Paulo. No princípio intitulou-o “Iniciação à Literatura”. Mas, alguém alertou-o para os equívocos que poderia provocar. Pois, o intuito era “não iniciar o leitor na literatura, isto é, na leitura de obras, mas, sim nos estudos acerca da literatura, ou seja, nos problemas da crítica literária”. Diante disso adotou “Introdução à Problemática da Literatura”, que o editor tomou como subtítulo e deu como título A Criação Literária. Na verdade  é um tratado que, segundo a modéstia do autor consiste em “oferecer ao leitor não especializado, portanto aos estudantes e ao público em geral, uma iniciação, uma introdução ao exame de alguns problemas fundamentais da teoria e filosofia da literatura”. Uma consistente iniciação, vale dizer. Análise detalhada dos gêneros, espécies e fôrmas literárias, com destaque especial para o romance. Como recurso ao desenvolvimento posterior dos temas estudados, é feita uma seleção dos livros mais importantes classificados conforme o sumário da obra: (1) conceito de literatura, (2) poesia e prosa, (3) gêneros literários, (4) espécies poética, fôrmas poéticas, (5) o conto, (6) a novela, o romance, (7) crítica literária. São mais de 100 títulos, contendo a referência bibliográfica das obras clássicas em cada área. Para facilitar a consulta, o autor acrescentou algo essencial neste tipo de livro, que poucos autores nacionais dão importância: um detalhado índice analítico que permite o leitor localizar qualquer termo mais específico contido na obra. 

1976

12 - BENEDETTI, Mario. Tem sentido escrever? São Paulo, Escrita, vol. 14, n.2, 1976.

A pergunta clara e objetivamente formulada tem uma resposta no mesmo quilate: “Sim, tem sentido escrever, sempre que você não se engane a si mesmo, o que me parece um requisito indispensável para não enganar os demais”. Para respondê-la assim, Benedetti faz uma análise do tema proposto, com ênfase no aspecto da solidão do escritor. Temos aqui um texto célebre onde o literato fala de outras coisas sobre a sua especialidade. Valendo-se do papel político do intelectual, atribuído por Gramsci, parte para uma definição das necessidades da escrita no processo de transformação da sociedade. “Por que acreditar que o povo não é capaz de indagar e analisar em profundidade a proposta original de um escritor?”, pergunta. A solução está em não enclausurar a literatura em compartimentos fechados, inacessíveis ao alcance popular, através de um vocabulário hermético. Desse modo, chegamos ao conceito de participação, que “não significa assistir estaticamente à expressão de uma arte que, a pretexto político, pode ser, em sua forma conservadora e até reacionária”. Dito assim, pode parecer que o escritor deve estar preso à realidade, mas não é isso. O escritor “não deve assumir uma fidelidade submissa frente a ela”. Seu trabalho deve se converter “num trampolim para a sua imaginação, num fator motivante e desencadeante de seu mundo de ficção”. Para explicitar a idéia, cita Antonio Machado quando disse: “Se miente más de la cuenta por la falta de fantasia. Tambiém la verdad se inventa”. Neste ponto, Benedetti faz coro ao pensamento de Richard Ford (Ref.18) em defesa da inventividade na literatura e prossegue: “quando o escritor possui fantasia suficiente para inventar uma verdade e não uma mentira, curiosamente essa verdade se casa com a realidade”. Aí está uma das forças propulsoras da literatura como fator de transformação social. Para constatar essa verdade, “quantas vezes um narrador ou poeta sentem que seu mundo inventado não é, em última instância, uma correção da realidade passada, mas uma proposta de realidade futura?” Critica a proposta de Walter Benjamin, quando diz que “o escritor não pode ver a mudança social, a revolução e o que ocorre ao seu redor, a não ser a partir de sua própria solidão; nunca a partir da luta de classes, como acontece com os demais membros da sociedade”. Benedetti acha que esse cultivo ideológico da solidão do escritor tem servido para defender a não participação do escritor nas transformações políticas e sociais. Admite que refugiar-se na solidão para escrever é “uma possibilidade cabível, mas não uma atitude obrigatória”. Dá no mesmo dizer que o “escritor e/ou intelectual é a consciência crítica da sociedade”. Dito assim, isoladamente, isto não passa de um ato incontestável de soberbia”. Está claro que o escritor “tem o direito de ser consciência crítica da sociedade, mas enquanto cidadão... e não pelo fato fortuito (ou privilegiado) de ser um intelectual”. Quanto a solidão, o autor acha que a única forma do escritor vencê-la “e superar sua frustração ou seu egoísmo é trazer seu esforço à luta de classes e à dura faina para se alcançar, por fim, o desenvolvimento”. Sua crença está assentada numa realidade “onde somente numa economia desenvolvida na base da justiça social, pode surgir uma cultura desenvolvida, pode o homem (e o escritor, como homem) superar sua solidão”. Não é justo nem lógico que essa luta seja travada “apenas pelos demais membros da coletividade (como querem Benjamin e os latino-americanos que nele se apóiam) sem contar com a participação do intelectual”. Isto não quer dizer que tal participação resolva o problema da solidão do escritor. Pois, “se depois de cumprido todo um processo de maturação social e de inserção numa luta comunitária, ficamos ainda melancolicamente escravos de nossa solidão e nossa clausura, não é porque sejamos superiores ao meio, nem porque o meio não nos compreenda, mas provavelmente porque temos mais taras congênitas e padecemos de mais cavilações e deformações de origem do que o cidadão comum e rústico”, afirma num rasgo de extrema abnegação de seus talentos e simplicidade de comportamento e convívio social. Conclui pela necessidade do escritor descer da torre de marfim, o que “às vezes representa um transe pesado e complicado, mas não há dúvida de que o artista emerge deste crisol pouco menos que purificado, revitalizado e, não poucas vezes, curado para sempre desta doença chamada solidão”.

1982

13 - SÁBATO, Ernesto. O escritor e seus fantasmas. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1982.

Na ânsia de um resumo esclarecedor, encontrei estas "palavras prliminares à primeira edição", ditadas pelo autor: Este livro está constituido por variações em torno de um só tema, tema que me tem obcecado desde que escrevo: por que, como e para que se escrevem ficções? Inúmeras vezes me formulei a mim mesmo estas perguntas, elas me foram formuladas por escritores e jornalistas. E em cada uma destas ocasiões fui tomando consciência destas obscuras motivações que levam um homem a escrever, séria e até angustiadamente, sobre seres e episódios que não pertencem ao mundo da realidade; e que, no entanto, por curioso mecanismo, parecem dar o mais autêntico testemunho da realidade contemporânea. Não sei que valor em estética ou ontologia poderão alcançar estas notas, mas sei, isto sim, que têm o valor dos documentos fidedignos, pois foram elaborados ao meditar, reiterada e encarniçadamente, sobre meu próprio destino de escritor. Falo, pois, de literatura como um camponês fala de seus cavalos. Minhas reflexões não são apriorísticas nem teóricas, senão que foram se desenvolvendo com contradições e dúvidas (muitas delas persistentes), à medida que escrevia as ficcções: discutindo comigo mesmo e com os demais, neste país ou naqueles em que constantemente há pessoas que nos dizem o que é o que deveria ser uma literatura nacional. Têm, em suma, algo do "diário de um escritor" e se parecem, mais que nada, a esse tipo de considerações que os escritores sempre fizeram em suas confidências e em suas cartas. Por isso preferi manter essa forma reiterativa e insistente mas viva, um pouco da mesma desordem obsessiva que uma e outra vez essas variações se apresentaram em meu espírito. Para quem escrevo este livro? Em primeiro lugar, para mim mesmo, com o intuito de esclarecer vagas intuições sobre o que faço em minha vida; logo, porque penso que pode ser úteis para muitas pessoas que, como eu em minha época, lutam por encontrar-se, por saber se de fato são escritores ou não, para ajudá-los em uma resposta sobre o que é a ficção e como é elaborada; também para nossos leitores, que amiúde nos escrevem ou ou nos detém na rua para falar a respeito de nossos livros, ansiosos por se aprofundarem em nossa concepção geral da literatura e da existência; e, enfim, para esse tipo de crítico que nos explica como e para que devemos escrever. Em qualquer destes casos, quem o ler pode ter a certeza de que não está de frente a gratuitas e engenhosas idéias ou doutrina, senão frente a meditações de um escritor que duramente encontrou sua vocação, através de ásperas dificuldades e perigosas tentações, devendo eleger seu caminho entre outros que se lhe ofereciam em uma encruzilhada, tal como em certos relatos infantis, sabendo que um só e só um conduziria à princesa encantada. Lerá, por fim, as meditações de um escritor latino-americano, e portanto as dúvidas e afirmações de um ser duplamente atormentado. Pois se em qualquer lugar do mundo é duro sofre o destino do artista, aqui é duplamente duro, pois além disso sofremos o angustiante destino do homem latino-americano. O livro, como ressalta o autor, é uma "colcha de retalhos" de textos curtos e até curtíssimos sobre a fazer literário, sobre o que é literatura, o que é ser escritor enfim. 137 textos, dentre os quais destacamos alguns para dar uma idéia geral do livro: O principal problema do escritor, o romance total, planos e obras, literatos e escritores, limitação e forçada literatura, a misteriosa criação, a palavra exata, o outro ofício do escritor, atributos do romance, arte e sociedade, o tremor de escrever, prosa e poesia, sobre a metáfora,   recriação constante, crítica aos críticos raízes da ficção, o mal e a literatura, que é um criador? o roamence e o mundo moderno e

1982

14 - LUCAS, Fábio. Por que escrever? In: Razão e Emoção Literária. São Paulo: Duas Cidades, 1982.

 Trata-se do primeiro texto de autor brasileiro a se debruçar sobre a questão. Desse modo, Fábio Lucas é pioneiro entre nossos teóricos e críticos literários ao enfocar a pergunta. Sua análise inclui os aportes à questão tanto do ponto de vista filosófico (Jean-Paul Sartre) como literário (Alain Robbe-Grillet e Augusto Abelaira), demonstrando a amplitude do estudo. “Enquanto para Sartre autor e leitor encontram no texto a essencialidade possível e exercem sua liberdade objetivamente, para Robbe-Grillet a escrita é um questionamento”. Já para Augusto Abelaira, “escrita e leitura são amalgamadas numa só operação”, conforme sua declaração: “Ser escritor é, em grande parte, ser também leitor... porque escrevemos sempre, tentamos escrever, desnecessário será dizê-lo, o livro que desejamos ler mas não existe ainda, o livro de que sentimos angustiosamente a falta”. Fábio Lucas, além de levantar a questão entre nós a partir das reflexões destes três ilustres autores, analisa o problema situando alguns escritores que manifestaram interesse pela questão: Jorge Luis Borges, “que formula bem o imperativo que assedia o escritor em sua atividade, dando sentido a duas negativas que traduzem o caráter compulsivo do ato de escrever”: no puedo no escribir. O autor encontrou em Graciliano Ramos uma grande semelhança com o raciocínio de Borges. Ao fim do segundo capítulo de São Bernardo, em que “relata as tentativas de a personagem central escrever um romance encontramos este diálogo significativo: ‘Então para que escreve?’ ‘Sei lá’”. Mais a frente, já no capítulo 19, tendo “amadurecido o drama confessional da personagem, volta à questão convulsiva: ‘Com efeito, se me escapa o retrato moral de minha mulher, para que serve esta narrativa? Para nada, mas sou forçado a escrever’.” Mas é na obra A Hora da Estrela, que o autor encontra a pergunta “por que escrever?” feita de modo mais incisivo. Através de Clarice Lispector, “no fino tecido de sua prosa vamos encontrar sugestões que poderiam estar em Sartre, em Robbe-Grillet, em Abelaira, em Graciliano Ramos ou em Borges”. Em Clarice encontram-se mais de 10 citações explícitas ao tema em questão, devidamente analisadas e comparadas pelo autor com afirmações de outros escritores. Trata-se de uma “narrativa em que um escritor relata a criação de uma personagem e o destino dela, humilde, mas desejosa de ter uma hora apoteótica, a hora de estrela”. Segue o relato de algumas destas citações com indicação da página localizada na edição de 1977, lançada pela Livraria José Olympio: “Enquanto eu tiver perguntas e não houver respostas, continuarei a escrever (p. 15); Por que escrevo? Antes de tudo, porque captei o espírito da língua e assim, às vezes, a forma é que faz conteúdo. Escrevo, portanto, não por causa da nordestina mas por  motivo de força maior, como se diz nos requerimentos oficiais, por força de lei (p. 23); Pensar é um ato. Sentir é um fato. Os dois juntos – sou eu que escrevo o que estou escrevendo (p. 15); Quanto a mim, só me livro de ser um acaso porque escrevo, o que é um ato que é um fato (p. 45); Escrevo por não ter nada a fazer no mundo: sobrei e não há lugar para mim na terra dos homens. Escrevo porque sou um desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de me ser e se não fosse a sempre novidade de escrever, eu me morreria simbolicamente todos os dias (p. 27).” O autor verifica que a questão reaparece constantemente no romance, constituindo-se no “leit-motiv” do romance, e registra seu final, quando “assume tom profético e confessional, assinala a compulsão de escrever como tempo de espera:” Estou absolutamente cansado de literatura: só a nudez me faz companhia. Se ainda escrevo é porque nada mais tenho a fazer no mundo enquanto espero a morte (p. 48)”. Uma tal análise literária de A Hora da Estrela, faz desse romance uma obra que poderia justamente ser enquadrada entre aquelas que devem ser lidas e interpretadas de dois modos: antes e depois da análise de Fábio Lucas. Para concluir, o autor – tendo esmiuçado o ato de escrever – faz uma reflexão para “valorizar a captação da essencialidade e da totalidade que o ato da leitura oferece”. À parte o entretenimento oferecido pelas obras digestivas ou “culinárias”, a obra literária de valor, “além de uma pergunta, encerra um convite à reflexão”. E prossegue: “o conhecimento aprazível de um trecho literário nos faz imaginar o mundo inteiro, evoca-nos o destino do homem, acorda em nós o gosto da associação ideativa, caminho pelo qual tentamos recuperar a realidade”. Diferente de qualquer função utilitária, o signo literário “efetiva uma ligação (vínculo) entre emissor e receptor, estabelece uma ponte entre duas individualidades e permite a passagem de um juízo crítico”. Afirma que a literatura “não se exaure na sua função hedonística de simplesmente gerar prazer estético”. Para reforçar sua idéia, cita a “crítica que Medvedev e Bakhtin endereçam a todas as concepções hedonísticas da arte, em favor de uma visão ideológica, cuja pluralidade de linguagens defendem: ‘Todas as coisas ideológicas são objetos de relação social, não objetos de uso individual, contemplação, experiência emocional ou prazer hedonístico’”. Finaliza citando Drummond, “que realiza preciosa síntese do valor relacional de qualquer discurso: ‘Fica sempre uma franja de vida onde se sentam dois homens’.” (“Passagem de Ano”)

1985

15 - FOGEL, Jean-François. RONDEAU, Daniel. (Org.) Pourquoi écrivez-vous?: 400 écrivains répondent. Paris: Libération, 1985.

A descrição dos editores é perfeita: o primeiro atlas da literatura contemporânea. Os maiores escritores vivos do mundo se explicam sobre os mistérios da criação literária. Os diretores da obra acham – e estão certos – que é mais que um atlas, é um excepcional auto-retrato da literatura atual, um instrumento indispensável de consulta. No estado bruto, o trabalho se assemelha a “um ensaio de geografia literária. Circunavegação inédita”. Uns escritores se derramam numa longa resposta, quase ensaio sobre a questão; outros respondem secamente, e outros despistam a resposta. O levantamento, realizado pela redação do jornal “Libération”, conta com mais de 400 escritores de 78 países. De certa forma, havia o interesse em dar continuidade ao trabalho iniciado pelos surrealistas em 1919 (Ref. 04), onde foram consultados 83 escritores.  Lamenta-se a pouca participação da Rússia, onde apenas quatro escritores enviaram suas repostas. O material contido não é representativo da literatura soviética. O “livre de poche” está organizado em ordem alfabética por país, com índice de autor e geográfico, facilitando a consulta.

1987

16 - GALEANO, Eduardo. Defesa da palavra. Rio de Janeiro, O Nacional, 30/11/87. p.3

O texto assemelha-se a um “manifesto político”, exortando à necessidade da escrita como forma de denúncia das condições humanas e exploração dos povos, particularmente na América Latina. A resposta do autor à pergunta “por que escrevo?” – contida neste livro e extraída deste texto – é representativa de seu pensamento naquele momento, e naquela divulgação – editorial de um jornal combativo. Galeano defende uma idéia: “o que a gente escreve pode ser historicamente útil somente quando de alguma maneira coincide com a necessidade coletiva de conquista de identidade”. O escritor, ao declarar-se “assim sou”, está colaborando para que muitos possam também tomar consciência do que são. Finaliza com mais uma defesa da escrita como testemunho de uma época, como a dizer “Estamos aqui, aqui estivemos; somos assim, assim fomos”. Não se trata de uma contribuição teórica ao estudo da questão, é mais um desabafo digno de registro em certos momentos históricos, como aqueles que o autor viveu. Visto de outro modo, atualizando a defesa da palavra, é a exaltação da necessidade de mantermos viva a defesa da literatura diante da avalanche de comunicação visual e simplificação (redução) da linguagem.

1991

17 - MILLOT, Catherine. La Vocation de l‘Écrivain. Paris: Gallimard, 1991.

Conforme Betty Millan, que entrevistou a autora sobre o livro, trata-se de um “modelo de ensaio não-dogmático, onde são focalizados Proust, Flaubert, Colette, Sade, Hoffmansthal, Mallarmé e Rilke, procurando explicar estes destinos em que a escrita determinou o curso da vida”. A autora, não obstante ter uma idéia sobre por que se escreve, acredita que “a resposta só interessa se considerada de uma maneira como as coisas se passaram para cada um em particular”. A idéia da filósofa, psicanalista e ensaísta sobre o que leva alguém a se tornar escritor é “que o escritor vive uma determinada experiência que poderia ser qualificada de mística, se ela não acontecesse num contexto fora, a experiência de algo enigmático que o sujeito procura decifrar escrevendo. Isso eu encontrei sobretudo nos poetas, Rainer Maria Rilke, por exemplo, que fala do ‘espaço interior do mundo’, uma experiência de abolição da fronteira entre o dentro e o fora. Também verifiquei a idéia no caso de Joyce, que coloquei entre os poetas por causa do que ele chama de ‘epifania’, o momento em que uma coisa manifesta sua essência. Trata-se de uma experiência de tipo místico-estético”. Temos aqui uma concordância com João Gaspar Simões (Ref. 08). A parte sua idéia pessoal, o objetivo do livro, segundo ela mesma, é “mostrar que o estilo é uma atualização da fantasia inconsciente do autor”.

Obs.: Resumo extraído a partir da entrevista publicada na Folha de São Paulo, em 25/4/93 e republicada no livro de Betty Millan, A Força da Palavra, R. Janeiro: Record, 1996.

1994

18 - GARANCE, Marie. Quando o escritor se entrevista. São Paulo: Brasiliense, 1994.

Um livro, para dizer o mínimo, curioso. Não traz informação alguma sobre a autora, e poucas informações sobre a obra. Mas, alguma coisa pode ser obtida na 4ª capa e no sumário do livro. Lá diz que o livro se destina à “quem tem dois grandes desejos na vida: escrever e escrever”. Em seguida lança meia dúzia de perguntas - Um escritor está sempre consciente do que faz? É preciso conhecer os clássicos? A infância é a mãe do escritor adulto? O mais difícil: a primeira ou a última frase? A ignorância literária do seu editor desperta em você... Sua conta bancária é equiparável ao seu talento? -  Após esse desfile de perguntas desconexas, traz uma mensagem “Um convite à reflexão e ao exercício”. Propaganda  à parte, a intenção é realmente convidar o pretendente a escritor a refletir e exercitar sobre as questões que se colocam ao fazer literário. São quase 150 páginas com duas perguntas formuladas no alto e no meio de cada página e todo o espaço em branco, supostamente, para ser preenchido pelo aspirante a escritor numa suposta entrevista. São quase 300 perguntas divididas em seis, digamos, capítulos expostos no sumário: Escrevendo, Lendo e aprendendo, Inspiração, E a técnica?, Editores etc., Retrato de corpo inteiro. Muitas das perguntas são banais e outras tantas pertinentes. Exemplos: “Cercado de baixo-astral por todos os lados insiste em escrever porque...” é uma das primeiras perguntas que normalmente se faz aos escritores. O “capítulo” sobre a técnica traz perguntas como: “È capaz de responder quais figuras de retórica assombram seus textos?” ou “Quando refaz um texto usa mais a expansão ou a condensação? O último “capítulo”, retrato de corpo inteiro, contém os questionamentos mais pessoais no sentido de verificar se o pretendente deseja mesmo ser um escritor: “Além de escrever, o que mais você faz?; Sabe realmente o que é forma e conteúdo?; O gênero epistolar está em baixa? Com quem, afinal se corresponde?”; Tamanho é documento em literatura?” Pelo volume e variedade das perguntas, pode-se dizer que qualquer pessoa que se disponha a responde-las sinceramente, já dispõe de uma enorme vontade de ser escritor.

1996

19 - PERISSÉ, Gabriel. Ler, Pensar e Escrever. São Paulo: Editora Arte & Ciência, 1996.

Como o título deixa claro, para escrever bem é preciso antes ler e pensar. Tal propósito é realçado pelo autor na introdução: “Este livro tem a preocupação de motivá-lo ou motivá-la a pensar por conta própria, a ler um pouco melhor e, como decorrência natural, como subproduto, escrever com precisão e espontaneidade”. Gabriel é um jovem poeta, tradutor, editor e professor com dez anos de estudo e experiência no trato com as palavras. Seu livro é, no fundo, o balanço e o resumo desse período, que culminou com a criação da Escola de Escritores, em 1994, em São Paulo. Não tem a pretensão de se constituir em manual, e este aspecto notabiliza o livro, devido ao enfoque, a leveza de estilo e sinceridade contida nos temas abrangidos. Não por acaso o último sub-capítulo do livro intitula-se “A convicção que inspira”. Neste particular, o prof. Gabriel nos ensina que “o esforço necessário para escrever bem não deve ser usado para escrever bem. Deve dirigir-se antes à aquisição da força intelectual, imaginativa e afetiva que, esta sim, fará a pessoa capaz de transformar a linguagem de todos, a língua de um país, o patrimônio verbal comum, em idioma pessoal, em estilo próprio. Tal lição combina com o enunciado na primeira página do livro: “para escrever bem é preciso não querer escrever bem”. Dividido em apenas três capítulos - O lugar da leitura, A formação intelectual e Escrever para escrever -, os quais se subdividem em mais três sub-capítulos abordando temas como a importância do questionamento, a técnica pessoal, o rascunho, o cotidiano e a nostalgia do sagrado (que fez de Paulo Coelho um best seller) etc. Ao final do primeiro capítulo e reforçando a importância da leitura, é fornecida uma lista pessoal de 64 títulos de livros clássicos e/ou importantes na concepção do autor, cada qual seguido de um breve comentário.     

1997

20 - MANDIL, Ram Avraham. Para que serve a escrita? in: ALMEIDA, Maria Inês de (org). Para que serve a escrita? São Paulo: EDUC, 1997.

Uma tentativa de resposta a partir da visão psicanalítica. Segundo essa visão, a resposta que tem valor de hipótese e vem orientando uma perspectiva de trabalho é, sobretudo após Lacan, “a escrita serve para escrever o que não pode ser escrito”. Para evitar o paradoxo, o autor distingue entre a escrita, de um lado, e o que não pode ser escrito, de outro. A tese do autor é que ao escrevermos somos “movidos pelo que não é capaz de se inscrever”, esclarecendo que “buscar escrever o que não pode ser escrito não é da mesma ordem que buscar escrever o que não pode ser falado”. Esclarecido o fato, o autor parte para as distinções entre falar e escrever no nível da clínica psicanalítica. Pois falar implica numa escuta, ao passo que escrever implica numa leitura. Não foi por outra razão que “Freud tenha optado pela leitura dos textos produzidos pelos psicóticos muito mais do que pela escuta desses pacientes”. São duas as vias pelas quais a psicanálise se relaciona com a escrita. A primeira tem como base o próprio Freud, para quem a escrita parece vir subordinada à relação entre a psicanálise e a literatura. Ao constatar que, sob certos aspectos, as obras literárias antecipam as descobertas da psicanálise, Freud se entrega à investigação sobre as possíveis conexões entre o saber do escritor e o saber inconsciente. A segunda via “surge de uma inflexão produzida por Lacan a partir de certas pistas deixadas por Freud”. Tais pistas indicam outra relação entre a psicanálise e a escrita, a partir de uma leitura do que se ouve do inconsciente. Através de Freud, e um pouco contra Freud, Lacan estabelece uma nova relação entre psicanálise e escrita, não mais medida, pura e simplesmente, pela literatura, mas tendo como referência as letras. É através da dimensão da letra – analisando como essa dimensão se constrói ao longo do ensino de Lacan – que o autor faz uma avaliação da escrita quanto à sua função no discurso da psicanálise. A dimensão da letra “é algo permanentemente avaliado ao longo do ensino lacaniano”, ao ponto de se falar numa teoria da letra. O autor faz uma correção ao falar de uma teoria da letra em Lacan, evitando assim uma redução no pensamento lacaniano. Esclarece que Lacan utiliza todo o potencial de leitura que a língua francesa oferece para o significante lettre, sem fixá-lo num único significado. La lettre pode designar tanto o elemento tipográfico – a letra – quanto referir-se a uma carta, isso quando não vem indicando o ser (l’être). Assim, o autor encontra uma perspectiva mais favorável para medir a função do escrito pensado a partir da psicanálise.

21 - FORD, Richard. De onde vem a escrita?. Folha de São Paulo, Caderno Mais, 27/9/97. p. 5-5.

Como surgem os textos elaborados, pensados pelo escritor? O autor credita parte da resposta à Wordsworth: “a boa poesia é o transbordamento espontâneo de sentimentos poderosos”. Em seguida, alinha algumas razões para explicar o fato de tantos, “durante muitos séculos, queimarem as pestanas sobre tal questão”. Entre as razões, encontra-se o fato de a escrita ser um tormento, principalmente “quando se descobre que o assunto sobre o qual se escreve não é um dos tópicos mais envolventes para as conversas de botequim”. Outra força que mantém vivo esse tópico é a existência, entre os não escritores, de “uma crença leviana de que os escritores são pessoas especiais, fronteiriços de algum tipo, dotados de uma importante vida interior”. Questões básicas sobre como e por que “tornam-se um gesto de genuflexão diante do médium”. E os escritores sempre em busca de maior atenção pelo seu trabalho, “estão de costume inclinados a se tornarem o expoente de suas obras, quando não o seu próprio avatar”. Diante das dificuldades de responder à questão, o autor se confessa “seduzido pela visão romântica de que a invenção artística é um tipo de mágica fortuita” e passa a defender a inventividade como aspecto fundamental da criação artística. Neste ponto há uma coincidência com o pensamento de Benedetti (Ref.12). Para ilustrar a “tese”, coloca a impossibilidade de se reconstituir um romance a partir da obra acabada até a página original em branco. As verdadeiras conexões neste caminho de volta talvez nunca possam ser traçadas, “porque elas só existem naquela noite, interestelar, sombria, silenciosa, mas fecunda, na qual reinavam impulso, associação livre, instinto e erro”. Reforça a importância da inventividade, ao citar seu caso pessoal na escrita sobre crianças e, de forma mais inquisitória, “como posso escrever sobre crianças, dotando-lhes desse ou daquele traço, sem jamais ter tido um filho”. Diante dos questionamentos dos leitores e crítico sobre as fontes e das possíveis respostas, a mais plausível é “embora eu já tenha sido criança e embora exista esse montão de pirralhos... ainda assim escrevo sobre crianças, inventando-as. O autor sente-se tentado em dadas ocasiões, quando impelido ou pressionado a falar das fontes, dizer “com todas as letras: eu invento estes fedelhos, é isso. Processe-me se quiser”. Em reforço à sua “tese”, cita dois autores: Wallace Stevens, ao afirmar que “numa era de incredulidade (...) cumpre ao poeta prover a satisfação da crença em seu metro e em seu estilo”; e Frank Kermode, que escreveu há 30 anos “não é que somos especialistas em caos, mas estamos circundados por ele e equipados para a coexistência com ele fundados somente em nossos poderes ficcionais”. Conclui definindo o tipo de inventividade que pratica: personagens, paisagens, “corações partidos inventados e suas posteriores reparações” e a crença que “sua aceitação na literatura (agindo como substituto para crenças menos aceitáveis) sugere que para cada problema humano, para cada labirinto, beco sem saída, para cada desespero há uma chance de podermos conjurar uma solução melhor”. Ao seu ver, não acreditar na inventividade, no poder ficcional, só crer no que é rastreável, é uma “receita certa para as tormentas da desilusão”, ao mesmo tempo em que se constitui numa “censura à capacidade dos homens imaginarem o que poderia ser melhor e, com boa vontade, partirem em sua busca”.

22 – VARGAS LLOSA, Mario. Cartas a un novelista. Madrid: Editora Ariel. 1997.

Um ano após lançado, a Editorial Planeta relançou com uma pequena modificação no título: acrescentou “joven”, na intenção de copiar o título de Rilke (Ref. 03). Providenciei a importação do livro, e enquanto não recebo vamos nos contentar com o informe publicitário extraído da Internet: “Como se chega a ser um escritor?. De onde saem as histórias contadas nos romances?. Como usar o material autobiográfico?. É possível falar da liberdade e da responsabilidade do escritor? Mario Vargas Llosa escreve a um aspirante a romancista e responde todas suas dúvidas. Fazendo uso de sua brilhante inteligência e recorrendo a sua experiência de escritor profundamente comprometido com sua profissão, abrange todos os temas que interessam àqueles dispostos a responder o chamado de uma vocação que, além de talento natural, exige esforço e constância. Desse modo, abarca todas as indagações de seu interlocutor epistolar: o significado dos prêmios, do reconhecimento público, da venda de livros e do prestígio social do escritor, o êxito como estímulo essencial contraposto ao exercício dessa vocação como a melhor recompensa, o valor da disciplina e da perseverança no ele chama de “a construção de um talento”, a predisposição a fantasiar como o primeiro passo do verdadeiro exercício da literatura, a indissolúvel relação fundo-forma, o estilo, a técnica narrativa, a voz própria, o ajuste perfeito entre palavra e idéia, o ponto de vista, o espaço e o tempo, o poder persuasivo de uma história, a organização do relato, a ambigüidade, os dados escondidos, os “vácuos”de uma história.”            

1998

23 - PIZA, Daniel. Por que escrever. Gazeta Mercantil, Caderno Fim de Semana,1/3/98. p.5

Reportagem sobre o livro que o leitor tem em mãos, quando ainda não passava de um projeto, disserta sobre as dificuldades da escrita literária, mesmo para “aquele que parece escrever com a facilidade de quem faz xixi”, e constata o ato de escrever como “imperioso” para o escritor. Trata-se de um “atributo orgânico que precisa ser realizado sob pena de incômodos ainda maiores”. É como se o escritor estivesse condenado a um suplício prazeroso. Para reafirmar sua idéia, acrescenta: “Sabe-se de escritores que deixaram de publicar, mas é raro aquele que deixou de escrever”. Comenta algumas das respostas de grandes escritores e passa a refletir sobre o vazio das respostas, que “não exprimem a complexidade do ato”. Em seguida, desmonta os argumentos mais costumeiros que os escritores utilizam para explicar por que escrevem. Considera que o escritor não escreve só para si, escreve para ser publicado, e “publicar é uma boa forma de você forçar a si mesmo uma limpeza nos canos, para que a fonte jorre com energia e volte outra vez”. Por falar em energia, lembra que “escritor é mais sujeito a blecautes do que a Light”. Tudo – o clima, humor, sono, alimentação – afeta o escritor, que “não pode estar desanimado”, e cujo “texto terá algum sabor à medida que sua intensidade se manifestar”. Mas, adverte: “intensidade em doses grandes ou fases breves também atrapalha”. Após breve referência aos elogios – “devem ser vistos como meios de orientação” – dos quais os escritores são alvos prediletos, define o grande desafio do escritor, como sendo o grande desafio da vida: “olhar a si mesmo como se estivesse de fora, impedindo que a autocrítica se torne indulgência ou acusação”. Não é fácil, considera, “por isso, eu releio e treleio todo texto que escrevo, não para lamber a cria, mas para verificar o que tentei fazer, o que realmente fiz e o que não queria ter feito”. Na sua opinião, é preciso “objetificar” a escrita, ampliando o grau de consciência sobre o texto, “para que o inconsciente e o subconsciente aflorem em acidentes bem-vindos”. São interligações, onde “a experiência e a imaginação ora se alimentam, ora se combatem mutuamente, e o escritor deve monitorar o fluxo, até mesmo sustando-o às vezes”. Isto serve para explicar “os dois enfrentamentos essenciais de qualquer escritor: a pessoa e o tamanho do texto”. Existe uma grande diferença entre escrever em primeira ou terceira pessoa, “especialmente na ficção, cuja liberdade acaba na maioria das ocasiões implicando um teor autobiográfico maior”. Cita o caso de Machado de Assis, que assumiu a primeira pessoa em Brás Cubas, encontrando “sua própria e rara voz” numa época em que o modo de escrita pedia a terceira pessoa, “o narrador onisciente que desenha o mundo ao redor”. Logo depois, com a modernidade, “a primeira pessoa se tornou dominante, e a escrita foi se afastando do desenho e se aproximando da música”. O autor cita sua própria experiência de ficcionista, que teve “uma guinada enriquecedora, quando saí da primeira pessoa e adotei a terceira, conseguindo um distanciamento criativo”, mesmo vivendo “numa época em que a ficção em primeira pessoa é a praxe”. Considera que a literatura atual busca um  meio -termo entre esses dois pólos, citando o caso de Philip Roth, que chegou a criar um duplo seu no livro Operação Shylock; e Amós Oz, que alternou as vozes dos protagonistas em Não Diga Noite. Sobre o tamanho do texto, afirma que “a maioria dos livros é maior do que deveria ser, e há uma minoria que deveria ser maior do que é”. Faz menção a Hemingway com talento para a forma curta; a Thomas Mann para a grande; e a Machado com talento nos dois casos. Apesar dessas inclinações serem fatos, “não devem trazer regras fixas, o que seria um desrespeito para com o princípio da incerteza que está no germe do gênio”. Conclui dizendo “que se escreve pelo conjunto de razões incluídas no livro: por sucesso, auto-expressão, necessidade, vocação, infelicidade, gosto, etc. (Por isso escrever e viver se aproximam tanto)” e encerra com sua resposta à questão: “por que escrevo?”, incluída neste livro.

2000

24 - SANT`ANNA, Affonso Romano de. A Sedução da palavra. Brasília: Letraviva, 2000.

O livro teve inicio em meados dos anos 80, Como fazer Literatura, uma coleção didática da Editora Vozes, coordenada por Herbert José de Souza, o Betinho. Nesta edição, o autor deixava claro que se tratava de “uma introdução simples para quem quer ter as primeiras informações sobre o fazer literário”.15 anos depois sua republicação é sugerida ao autor, complementando-o com uma série de crônicas abordando autores, artistas e a criação literária. Dito e feito, o livro se encontra dividido nestas duas partes: (1) Como se faz literatura e (2) a sedução da palavra, uma coletânea de crônicas, quase contos. Trata-se de uma obra essencial à quem pretenda se iniciar nos mistérios da criação literária. Escrito numa linguagem direta, “como quem conversa ao pé do ouvido de um amigo íntimo”, a 1ª parte vai desenrolando o novelo do fazer literário numa seqüência lógica em sete curtos capítulos. Para “começo de conversa” explica o que é exatamente um escritor e ressalta que “entre escrever e virar socialmente um escritor vai uma longa distância”. Em seguida descreve alguns ritos de iniciação literária: redações escolares, jornalzinho do colégio, jornal da cidade, revistas literárias, concursos, leitura por amigos, etc. Feita a introdução, passa-se ao ato de escrever estabelecendo-se as diferenças entre autor, escritor e redator. O autor pode não ser o escritor, pode contratar um ghost writer para escrever por ele. O redator diferencia-se do escritor pelo fato de o primeiro ter a obrigação de saber como tornar um texto eficiente na sua função. Pode-se até dizer que nem todo escritor é um bom redator, bem como nem todo redator seja um escritor. “O escritor verdadeiro é aquele que converte todos as sensações e pensamentos em linguagem”. O ato de escrever se torna numa segunda natureza. O mundo se lhe configura através das palavras, e se não as encontra para expressar algo sente um mal-estar, uma falta de apreensão da realidade. Assim, pode-se dizer que “o ato de escrever é um ato de apreensão da realidade... é um ato de construção”. Através da escrita, o autor vai descobrindo o que pensa, ele vai tomando conhecimento de si e do mundo. É comum vermos um autor admirado diante de si mesmo: “mas eu pensava assim? Eu não sabia que era capaz de pensar assim!. Por isto é que escrever é um ato de criação, uma epifânia”. Uma das dificuldades do escritor iniciante é publicar sua obra, dado o interesse comercial das editoras, e mais difícil ainda é fazer com que a obra seja lida. “Para que um livro seja lido é necessário que entre em algum circuito de comunicação”. Nem sempre é preciso qualidade literária, o que precisa é “cair numa rede ou sistema de relações”. Ele precisa estar inserido numa dessas situações: 1) Operação mercadológica. São as leis do mercado e da publicidade regendo o lançamento de uma obra, tal como se lança qualquer produto com promoções, anúncios, prêmios, etc. Tais leis fazem com que certos autores menores sejam lidos e traduzidos em boa parte do mundo. Os concursos literários e o Prêmio Nobel de Literatura estão inseridos nesta categoria. 2) Efeito da personalidade do autor. São as características pessoais que ajudam ou atrapalham a penetração da obra no mercado. Há os marketeiros, (Salvador Dali na pintura ou Paulo Coelho na literatura), os falsos tímidos e os tímidos de verdade. “A personalidade ajuda, mas não sustenta um texto”. Quando o escritor morre, sua literatura vai, também, se esvaindo. Pois, a literatura não é uma questão de mercado ou de charme pessoal. 3) A questão da linguagem. Os autores inovadores que captam as grandes questões de seu tempo são logo reconhecidos pelo editor, pela crítica e pelo público. Tornam-se porta-voz de um grupo, de uma comunidade, de uma geração. Exemplos desse tipo podem ser vistos na “beat generation” americana, nos modernistas brasileiros ou no “boom” literário latino-americano dos anos 60. São indivíduos ou grupo de indivíduos que criaram novas formas de expressão literária e com isto se impuseram ao público. 4) A crítica literária.  A crítica não ajuda muito a vender o livro. Os críticos usam uma linguagem que não atinge o grande público. O que faz vender são as reportagens sobre o lançamento, sobre o autor, sobre o tema da obra. Os norte-americanos inventaram a resenha (review), uma súmula do que trata o livro. Com isto o leitor fica sabendo de seu conteúdo, o que lhe ajuda na decisão de comprá-lo ou não. Se há pessoas que se aproximam da literatura com ideais românticos, há também os que se equivocam pelo contrário, pensando que podem enriquecer. O autor recebe apenas 10% sobre o preço do livro, e os 90% restantes é dividido entre o editor, o livreiro e o distribuidor. O comerciante alega que corre maiores riscos, é ele que investe seu dinheiro num livro que pode não vender. Logo, deve ser melhor remunerado. Por outro lado, o autor pode alegar que investe dois, cinco ou mais anos de sua vida numa obra. O fato é que num mercado editorial precário com poucas livrarias, poucas bibliotecas e poucos leitores todos reclamam e todos têm razão. Para concluir, chegamos ao “fazer literário por dentro”, título do último capítulo. Após breve relato das novas formas ou gêneros literários surgidos com a modernidade (James Joyce, Julio Cortazar, Clarice Lispector, Oswald de Andrade) parte-se para a indicação de um roteiro de leituras fundamentais ao escritor estreante. Dentre estas ressalta-se a leitura das Cartas à um Jovem Escritor (Record, 1981) e Lição do Amigo (José Olympio, 1982), de Mario de Andrade. Assinala que tais cartas são mais importantes que as Cartas à um Jovem Poeta, de Rainer Maria Rilke (Ref. 03) e que se Mario de Andrade “fosse um escritor europeu ou americano, essas cartas seriam best-sellers internacionais”.

                                                      2000

25– DOURADO, Autran. Uma poética de romance: matéria de carpintaria. Ed. revista e ampliada pelo autor. Rio de Janeiro: Rocco, 2000.

De início, o autor ressalta o fato de ser incomum no Brasil os escritores de ficção teorizarem sobre sua própria obra. A afirmação é correta para a época, quando pouco se falava e menos se escrevia sobre o assunto. Talvez, devido a escassez de textos nestes moldes, Autran Dourado tenha se motivado a contribuir com dois trabalhos reunidos num só livro. O primeiro – Uma poética de romance -, escrito em 1973, foi chamado por ele mesmo de “ensaio fantasia”, contendo suas reflexões sobre o fazer literário como parte de seu universo ficcional. Segundo Affonso Romano de Sant`Anna, neste livro, Autran Dourado “dessacraliza através de seu “mestre imaginário” o preconceito de que o escritor tem que ser ignorante e só pensar em devaneios”. Tais reflexões discutem a necessidade da arte poética e teorizam a respeito de conceitos literários, além de apresentar a “planta –baixa” (descrição detalhada da feitura) do romance O risco do bordado. O autor adverte que “as coisas mais importantes para os criadores sobre o romance, foram ditas por romancistas, e as coisas mais importantes sobre poesia foram ditas por poetas”. Discute a narrativa em blocos e a utilização da falsa pessoa em diversos de seus livros. Trata-se de um recurso utilizado para mudar a história da primeira pessoa para a terceira ou da terceira para a primeira. “É a falsa terceira pessoa, como há às vezes uma falsa primeira”, como pode ser visto em As roupas do homem. Sobre o estilo barroco, o qual já foi comparado, equivocadamente, a Guimarães Rosa, ele é taxativo: “O barroco para mim não é apenas um conceito histórico, capítulo da história da arte, mas algumas coisa viva e atuante, que me estimula na elaboração da minha própria criação literária”. Essa comparação foi feita a partir de Ópera dos mortos, mas o autor reluta em aceitá-la: “O que temos em comum, Rosa e eu, é o nosso chão de Minas. Em mim a alma barroca é torturada, o negrume arcádico e inconfidente de Minas. Em Rosa o aberto dos gerais, o cerrado livre e descampado, o cerrada livre e solto que vai dar em Brasília”. Outro aspecto esmiuçado refere-se a tônica da narrativa na concepção d alguns autores. Há quem, como Eichenbaum, considere “que o fim narrativo do romance é sempre um ponto de enfraquecimento e não de força; o clímax ou culminância do movimento deve estar antes do fim”. Já no conto ou novela é diferente, o fim coincide com a culminância ou clímax. Edgar Alan Poe não pensa assim e o próprio Autran Dourado considera que a tônica é a memória. “A memória do autor e a do leitor, cuja colaboração e identificação são solicitadas”. O leitor deve ter sempre presente na memória determinados temas ou motivos. Após algumas digressões sobre estilo e lugar-comum (cap. 7) e personagem, composição, estrutura (cap. 8), o autor encerra esta primeira parte com um depoimento pessoal (cap.9), onde relata dramas pessoais: “Aprendi, por exemplo, que escrever bem nada tinha a ver com escrever romance”. Explicando melhor: “a boa prosa e a prosa de ficção são coisas inteiramente diferentes. E eu tinha de optar entre ser bom prosador escrevendo ficção ou um bom romancista, mesmo correndo o risco de ser um mau prosador. Escolhi o romance, não sei se fiz bem”. Termina com a formulação de uma profunda reflexão: “O romancista, como todo artista, não cria para exprimir coisa alguma; ao contrário, exprime-se para criar, é o que concluo depois de longo convívio e aprendizado artístico nunca concluído”. O segundo – Matéria de carpintaria – é o resultado das aulas proferidas como escritor visitante no Departamento de Letras da PUC/RJ, em 1974, a convite de Affonso Romano de Sant`Anna, chefe do Departamento. Nesta parte apresenta-se os problemas de criação literária e o material (plantas-baixas) usado na feitura das obras Tempo de Amar, Ópera dos Mortos, Uma Vida em Segredo,  A Barca dos Homens e Os Signos da Agonia. Detalha minuciosamente as suas leituras, aborda teorias. críticos e escritores, desde a poética aristotélica, até nomes consagrados de filósofos e historiadores. Sugere métodos de análise e desmistifica o fazer literário: ”Faço gráficos e esquemas, sinopses, monto desenhos, armo quadrados, retângulos e círculos, como se fosse um arquiteto, régua, o compasso, o transferidor”. Muitos desses recursos são demonstrados na análise das obras citadas.     

 

2001

26 - RAMÓN NIETO. O Ofício de Escrever. São Paulo: Ed. Angra, 2001

Um pequeno livro que se destina, conforme a propaganda na contra-capa, a “explicar os fundamentos do ofício de escrever, de sua materialidade transcedência, de seus aspectos mais luminosos e mais obscuros. Em suma: o que é ser escritor”. Em 160 páginas divididas em 30 curtos capítulos, o autor faz um apanhado geral e suscinto dos diversos aspectos do ofício. Claro que não consegue cumprir todo o prometido na propaganda, mas consegue reunir uma boa quantidade de curiosidades, características e especificidades da arte e do fazer literário. São abordados tanto os temas referentes a criação literária, gênero, estilo, bem como aspectos particulares de produção literária de alguns autores, tal como escrever no exílio, na guerra ou na prisão. Não deixa de ser interessante saber das curiosidades ou “golpes” aplicados por Alexandre Dumas - que recebia por linha escrita – ao criar personagens gagos (que nos diálogos exigiam três linhas para dizer uma breve frase) ou que respondiam com monossílabos, de modo que cada resposta (sim, não, já) valia por uma linha. Analisa, também, as dificuldades enfrentadas pelo escritor, em comparação com outros ofícios, afirmando que “o escritor se dedica a colocar todo seu empenho em fazer aquilo que não sabe”. Pois se soubesse, não seria escritor. E acrescenta “ao concluir uma obra, cujo conteúdo ignorava no inicio, aquilo que aprendeu não lhe servirá para a obra seguinte. Além disso há uma enorme quantidade de dicas e informações dirigidas aos interessados no ofício: quanto ganham os escritores?; os prêmios literários; o que é sucesso?; para quem se escreve; como achar um título; a inspiração, etc. Como conselhos aos jovens escritores, o autor apresenta o decálogo de conduta do escritor, formulado por Hemingway há mais de 40 anos, mas que ainda  mantém sua validade: 1 - Esteja apaixonado; 2 - Comece a escrever; 3 - Contemple o mundo e fique estreitamente unido à vida; 4 - Freqüente a companhia de escritores; 5 - Não perca seu tempo; 6 - Ouça música e contemple pintura; 7 - Leia sem parar; 8 - Não tente se explicar; 9 - Ouça a sua vontade (ou seu desejo); 10 - Rasure: a palavra destrói o senso criativo.          

2002

27 - MAGALHÃES, Cristina Maria. Criar para ser, ser para criar: a constituição do self através da obra literária. São Paulo: Faculdade de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica. 2002 .

Trata-se de um “TCC-Trabalho de Conclusão de Curso” de psicologia, mas poderia ser uma tese de mestrado, devido aos cuidados na elaboração e à amplitude do estudo. A autora, movida por uma curiosidade pessoal, se dispôs a investigar porque se escreve literariamente através de depoimentos em entrevistas de quatro renomados escritores: Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector, Érico Veríssimo e Rachel de Queiroz. Como não sou do ramo, passo a transcrever seu resumo: “Este trabalho tem como objetivo a investigação do sentido que a obra literária tem, para seu autor, consciente ou inconscientemente, dentro de seu viver. Foi tomada como base a teoria winnicottiana a respeito da constituição do self, passando pelas origens não só do indivíduo, mas da criatividade e capacidade de criação, bem como o desenvolvimento do brincar, da relação e do uso dos objetos. A área transacional ou, mais especificamente, a transicionalidade, acaba sendo um conceito chave para nosso estudo e análise. A investigação foi realizada através da análise de entrevistas - coletadas em publicações, jornais e revistas – concedidas por escritores consagrados da literatura brasileira: Clarice Lispector, Érico Veríssimo, Rachel de Queiroz, e Carlos Drummond de Andrade. Os dados analisados nos permitiram vislumbrar o quanto a atividade literária é central na vida destes autores, não só como um modo de viver criativo, mas também como fonte de constituição de seus selves, já que a escrita lhes possibilita a expressão, o conhecimento e descobrimento de si mesmos, mediante a contemplação de novos sentidos e significados que insurgem da mesma. Pudemos perceber, ainda, que o fato de a escrita ser vital para estes escritores – no sentido de lhes permitir SER o mais verdadeiro de seus selves - não anula a possibilidade de encontrarem este mesmo tipo de viver criativo e significativo em outras áreas ou papéis de suas vidas”. Na apresentação, sugestivamente intitulada “O Eu que cria aqui e é”, a autora pede “que se entenda do que trata este trabalho e, por isso mesmo, repito que ele trata de mim mesma, respondendo às minhas próprias perguntas e me construindo à medida que se desenrolou esta investigação. E pretendi, mesmo, me descobrir através dela, vivendo a loucura de quem busca, de quem cria e de que anseia por uma resposta.” Mais adiante, declara que o trabalho iniciou há muitos anos, no inicio da adolescência, quando foi instigada por seu professor a escrever. “A partir de então, a escrita se tornou, para mim, a forma mais clara, clama e rápida de expor o que sentia, o que queria, o que perguntava e, mais ainda, o que eu era... Após longa caminhada, me vi no último ano da Faculdade de Psicologia e ainda não tinha a minha resposta: por que EU escrevo?” Podemos imaginar que Cristina encontrou respostas à sua pergunta. O mesmo não se pode dizer dos autores pesquisados por ela. Mas isto não importa, o que importa é a formulação da pergunta, pois como bem disse Fábio Lucas “nenhuma literatura progride sem se propor perguntas sem resposta”. O que importa é sua contribuição ao estudo dos mistérios da criação literária.               

2003

28 - SABINO, Fernando; ANDRADE, Mário de. Cartas a um jovem escritor e suas respostas. Rio de Janeiro: Record, 2003.

Affonso Romano de Sant`Anna considera que se Mário de Andrade fosse um escritor europeu ou americano essas cartas seriam best-sellers internacionais. Assegura que o livro é mais importante que Cartas a um Jovem Poeta de Rainer Maria Rilke.  Comparações a parte, o fato é que as 23 cartas de Mário de Andrade têm algumas semelhanças com as de Rilke. Além de tratar-se de uma correspondência entre mestre e discípulo, trazem conselhos assemelhados, como por exemplo quando Mario de Andrade aconselha: “Você se analise, pense seriamente sobre você, sobre si você sente mesmo em si a fatalidade pesada de ser artista, sobre si tem coragem e força para agüentar o tranco duro que vai ser o seu.” Em Rilke vemos algo parecido: “penetre em si mesmo e procure a necessidade que o faz escrever. Observe se esta necessidade tem raízes nas profundezas do seu coração.” (Ref. 03). As cartas de Mário tiveram uma influência fundamental sobre seu destinatário, começando pela mudança sugerida no nome do jovem escritor (18 anos), além de se constituir num “precioso roteiro para quem deseja iniciar-se nos mistérios da criação literária”. É o que promete a orelha do livro, lançado por Fernando Sabino em 1981 e relançado agora acrescido de suas respostas. O prometido é cumprido com os diversos conselhos referentes a disciplina para escrever; clássicos que devem ser lidos, com especial referência à Machado de Assis, que “não deve ser para você um companheiro de vida, mas apenas um tesouro onde você vai roubar”; lições de vida “o nosso problema humano não consiste em ter esperança numa vida melhor – consiste em fazer” e noutra carta “não se deixe desleixadamente viver como a maioria infinita dos nossos artistas brasileiros”; o conceito de arte, que não é só beleza, “é um fenômeno de relação, pelo menos entre dois indivíduos, o artista e o espectador”; o ser escritor “se você não fizer coisas maravilhosamente bem feitas como técnica, como estilo, como arte de escrever, como bom gosto espiritual, você será apenas mais um”. As cartas de Mário de Andrade foram escritas no período 1942-1945 e publicadas em ordem cronológica, seguidas cada qual pelas respostas de Fernando Sabino. Com isto foi estabelecido um verdadeiro diálogo. Um diálogo enriquecedor para a literatura, particularmente para quem pretenda enveredar por este caminho.

29 - REBELO, Katia. Mistério da criação literária. Univesidade Federal de Santa Catarina-UFSC. Dissertação sobe orientação de Lauro Jukes. 2003.

Os mistérios da criação literária surgem diante dos olhos dos próprios autores quando escrevem suas obras. Alguns teóricos tentam descrever a vida do autor através da sua obra. Outros não crêem num entrelaçamento tão profundo entre um e outro. Alguns autores tentam explicar o modo como criam, entretanto, às vezes, é difícil para os teóricos não ficcionistas absorverem tal compreensão pelo fato de não lidarem com a arte da criação. Quando os escritores relatam suas experiências em criarem suas personagens demonstram intimidade com esses seres de ficção. O romance como exemplo da parte teórica, traz a possibilidade de analisar a criação literária, através de uma personagem escritora nos seus momentos de criação. Na teoria como na produção do romance, os mistérios da criação literária são significativos na vida e na obra do autor.

 

2004

30 – ATWOOD, Margaret. Negociando com os mortos: a escritora escreve sobre seus escritos. Rio de Janeiro: Rocco, 2004.

O título do livro, copiado de seu último capítulo, sugere a hipótese “que não apenas alguns, mas todos os escritores do gênero narrativo, e talvez até `tudo` que se escreva, seja no fundo motivado pelo medo e a fascinação diante da mortalidade – por um desejo de empreender a arriscada viagem para os infernos e dali trazer algo ou alguém ao regressar”. Já o sub-título explica suas intenções, e do modo como está escrito, vê-se que são modestas as intenções, como modesta é sua autora. Mas, é deste modo que Margaret Atwood faz uma expressiva contribuição ao nosso tema dos “Mistérios da Criação Literária”. Não é comum vermos tanto despojamento na dissecação do caráter do escritor, da arte/função de escrever. A autora demonstra um interesse genuíno em querer saber mais, especular seriamente sobre esta atividade tão misteriosa, tão acessível e tão difícil ao mesmo tempo. O livro surgiu a partir de um ciclo de seis palestras apresentadas nas Empson Lectures, tradicional ciclo de conferências na Universidade de Cambridge. Tais palestras são dirigidas a uma audiência variada: jovens e não tão jovens, especialistas em literatura e estudantes, leitores em geral e, especialmente, escritores em fase inicial. Não se trata de um guia para aspirantes a escritor nem um relato do processo criativo da autora. Pode ser visto mais como um relato confessional da autora em seus 40 anos de experiência para refletir sobre o que é ser escritor. Cada capítulo traz o conteúdo de uma das seis palestras, reformulado para compor este livro. O 1º - Orientação: Quem você pensa que é? O que é um “escritor” e como vim a ser escritora? (grifos da autora) -  é autobiográfico ao mesmo tempo em que explica o que é ser escritor. Neste ponto há uma convergência com o pensamento de Affonso Romano de Sant`Anna (Ref. 24). Ambos reforçam a distinção óbvia mas que precisa ser ressaltada: escrever e ser Escritor. No primeiro caso temos a atividade necessária á todos e no segundo temos uma função socialmente reconhecida. No 2º capítulo - Duplicidade: A mão-monstro, e o duplo esquivo. Por que há sempre dois? - são apresentados os dois lados de todo escritor, o nome que figura na capa dos livros e a pessoa de carne e osso, inevitavelmente diferentes. Ela acha que “todos os escritores são duplos”, é como se tivessem dupla personalidade, e cita diversos trechos de autores conhecidos, onde esta característica é marcada. O 3º -Dedicação: O grande deus-pena. Apolo contra Maimmon: diante de que altar o escritor deve se prostrar? - trata do conflito entre arte e mercado. “Aborda os conflitos entre deuses da arte e do comércio que todo escritor que se considere artista continua a sentir”. Na página 95 consta um versinho em inglês, que numa tradução livre diz:

                                          Quem escreve por dinheiro

                                          precisa escrever  um milheiro

Parece até um provérbio advertindo os escritores para as armadilhas do mercado. O 4º - Tentação: Próspero, o Mágico de Oz, Mefistóteles & Cia. Quem empunha a varinha, puxa os cordões ou assina o livro de Satã? – “examina o escritor como ilusionista, artíficie e participante do poder político e social”. Reflete sobre o debate da importância social do escritor. A importância que ele se atribui, bem como a que lhe é atribuída pela sociedade. Conclui o capítulo dando um conselho ao jovem escritor: “cuide da escrita e a importância social cuidará  de si”. Isto porque  “não é o escritor quem decide se sua obra é importante”. Quem decide isto é o leitor. No penúltimo capítulo – Comunhão: Ninguém para ninguém. O eterno triângulo: o escritor, o leitor e o livro como mediador – é enfocada a emancipação do texto e o protagonista da literatura: o leitor. Muito já se falou sobre a independência do texto, que passa a ter existência autônoma do escritor. Porém, Margaret Atwood aborda essa questão com exemplos e uma convicção incomum. “De que maneira pode um texto crescer, se transformar e dar frutos? Ela pergunta e responde: “Somente por uma interação com o leitor, por mais afastado que esse leitor esteja no tempo e no espaço”. Com isto ela confirma o pensamento de Pablo Neruda: “Os poemas não pertencem àqueles que os escrevem. Pertencem a quem precisa deles. O 6º  e ultimo - A Descida: Negociando com os mortos. Quem desce aos infernos e por que? - é, como foi dito no inicio deste resumo, uma reflexão sobre as motivações literárias.    

 

- Link1
- Link2
- Link3