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Como escrevo?
Eucanaã Ferraz

“Escrevo poemas em cadernos, agendas, folhas soltas. Sempre papel. A lápis ou a caneta, escrevo, rabisco, anoto, faço setas; quando há versos ou estrofes que se interpõem, numero, ponho asteriscos; e lá vão ficando as idas e vindas. Quando o rascunho se faz difícil de entender pelo excesso de riscos (mesmo a lápis, não uso borracha, ainda que haja uma na ponta oposta ao grafite), reescrevo todo o poema em outra folha, na qual recomeço a mexer, cortar, acrescentar etc. O resultado mais próximo do final chega, por vezes, ainda nesses primeiros passos. Depois, vou para o computador. Preciso ver o poema mais limpo, mais próximo da cara que ele teria numa hipotética publicação. A digitação costuma dar vez a outras mudanças. Depois, imprimo, faço uma pausa – de tempo indeterminado – e volto a reler. Outra vez diante do papel, costumo fazer novas mudanças, cortes, acréscimos. A duração de tal processo é imprevisível. Tenho, além disso, um hábito que me parece particular ou, pelo menos, não me parece ser uma prática comum a todos que escrevem poesia. Durante todo o tempo da escrita, leio e releio em voz baixa, sussurrando. Preciso ouvir o poema. Então, vou lendo os versos para mim naquela altura mínima, como se testasse o ritmo. Talvez o volume baixo da voz tenha a ver com o fato de eu considerar o poema, sempre, uma voz baixa, uma maneira de inserção sutil no mundo, uma presença oblíqua, estranha, quase invisível. Nunca me impus essa prática. E, curiosamente, só após alguns anos tomei consciência dela, que não chega a ser um método, sendo talvez um instrumento, ou menos, mera idiossincrasia.”

Fonte: http://michellaub.wordpress.com (23/10/2012)

 

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