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Como escreve?
Georges Simenon

"Temos que distinguir entre consciente e inconscientemente. Inconscientemente eu provavelmente sempre tenho dois ou três, não romances, nem idéias sobre os romances, mas temas em minha mente. Nem sequer chego a pensar que eles possam servir para um romance; mais precisamente, são coisas com as quais me preocupo. Dois dias antes de começar a escrever um romance, elejo conscientemente uma dessas idéias. Mas, antes mesmo de elegê-la conscientemente, procuro, em primeiro lugar, uma atmosfera. Hoje há um pouco do sol aqui. Eu poderia me lembrar de uma certa primavera, talvez uma cidadezinha italiana, ou em algum outro lugar no interior da França, ou no Arizona, não sei, e daí, pouco a pouco, um pequeno mundo vai se formar em minha mente, com umas poucas personagens. Essas personagens vão ser elaboradas, por um lado, a partir de pessoas que conheço e, por outro, de pura imaginação - você sabe, é um conjunto de ambos. E aí a idéia que eu tinha anteriormente surge e se agrega em torno deles. Elas terão o mesmo problema que tenho em mente. E o problema - mais essas pessoas - me dará o romance... Dois dias antes porque, logo que tenho o começo, não consigo esperar muito tempo; aí, no dia seguinte, pego meu envelope, minha lista telefônica para os nomes e o mapa da cidade - sabe, para ver exatamente onde as coisas acontecem. E dois dias depois começo a escrever. E o começo vai ser sempre o mesmo; é quase um problema de geometria: tenho tal homem, tal mulher, em tais vizinhanças. O que pode acontecer que os obrigue a chegarem aos seus limites? Essa é a questão. Pode ser, às vezes, um incidente muito simples, qualquer coisa que transforme as suas vidas. Em seguida escrevo meu romance, capitulo por capítulo... No envelope eu anoto somente os nomes das personagens, suas famílias, suas idades. Não sei absolutamente nada acera dos acontecimentos que vão ocorrer mais tarde. De outro modo, não teria interesse para mim... Na véspera do primeiro dia, sei o que vai acontecer no primeiro capítulo. Daí, dia após dia, capítulo após capítulo, descubro o que vem em seguida. Depois de iniciado o romance, escrevo um capítulo por dia, sem nunca perder um dia. Como é um ritmo violento, tenho que seguir o ritmo do romance. Se, por exemplo, fico doente durante 48 horas, tenho que jogar fora os capítulos anteriores.  E nunca retorno àquele romance".

Fonte: Os escritores: as históricas entrevistas à Paris Review. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.

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