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Como escreve?
Katherine Anne Porter

"Toda história começa com um final. É aí que o artista começa a trabalhar: com as consequências dos fatos, não com os fatos em si mesmos. Ou com os acontecimentos. O acontecimento só é importante se afeta nossa vida e a vida dos que nos cercam. É na resverberações, nas implicações, que o artista trabalha. Nesse sentido, levei às vezes anos para compreender um pouquinho de algum fato importante que tenha acontecido comigo. Claro que podia fazer um relato perfeitamente factual do que havia acontecido, mas não sabia o que aquilo significava até descobrir as consequências. Se eu não sabia o fim de uma históira, não podia escrevê-la. Sempre escrevo primeiro as minhas linhas finais, o meu último párágrafo, a minha última página, e só então dou início ao meu trabalho. Sei para onde estou indo, sei qual é o meu objetivo. E como chego lá é por graça de Deus... O enredo é feito de forma a que você se encaminhe para um objetivo E esse objetivo é o fim da desordem, do caos e do errado para chegar a m final lógico e humano... Todos os meus sentidos sempre foram muito agudos. As coisas vinham a mim pelos olhos, e por todos os poros. Tudo me invadia de roldão. Acho também que a mente trabalhade várias maneiras. Às vezes uma idéia surge completamente inarticulada. Sem imagens, ou palavras ou - bem, é como uma nuvem escura movendo-se dentro da sua cabeça. Você fica na expectativa do que sairá dali e então ela se dissolve formando - não imagens, mas pensamentos mesmo. Você começa a pensar em palavras. Abstratamente. Então as palavras se transformam em imagens. Na hora de escrever a história, minhas criaturas estão vivas e andam e pegam coisas com suas próprias mãos. Elas existem independentes dentro de minha mente, assim como você diante de mim agora. Já me criticaram por não dar detalhes ao descrever meus personagens, tamouco o ambiente em que vivem. E o mais estranho é que para mim é tudo é muito claro "

 

Fonte: Escritoras e a arte da escrita: Entrevistas da Paris Review. Rio de Janeiro: Gryphus, 2001.

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