Não chego a tanto (me considerar um ‘divisor de águas na crítica literária brasileira’) porque jamais me atribui tal importância, mas a verdade é que inaugurei uma linha nova no estudo da crítica literária brasileira. Nem teria sentido agora bancar o modesto e não reconhecer o fato. Foi um esforço, um trabalho pensado, dirigido, coerente, no sentido de criar alguma coisa nova na área. Evidentemente isso não é algo que ficará para sempre, porque o setor é dinâmico, outros virão com novas linhas de pensamento. Mas, que fiz alguma coisa, não tenho dúvida que fiz. Que inaugurei e inovei não é fato que se negue. Contra a tendência de Silvio Romero, contra o impressionismo crítico, que matei em boa hora, juntamente com o ‘rodapé’ crítico. Guimarães Rosa me disse certa vez que eu ‘introduzi a moeda boa e expulsei a moeda má do mercado crítico literário brasileiro’. O rodapé referido era o instrumento dessa má, superficial e impressionista crítica que se fazia no País. Toda semana, algum homem de talento e sensibilidade literária olhava rapidamente um livro e escrevia artigo a respeito. Ora, até hoje ninguém me convence que uma pessoa que lê, muito menos bem, um livro importante em uma semana. Lê, no máximo, a orelha. Há muita gente fazendo isso, mas para ler e fazer artigo a respeito não dá...O que substituiu o que se chamava de crítica nos jornais é a resenha e nem pode deixar de ser assim porque o veículo é de notícia e não de cultura, como era no século XIX. Resenha é a primeira leitura porque é se trata de notícia válida. É a ‘review’, afinal. Crítica mesmo ainda se faz num ou outro jornal de grande porte no exterior, mas como exceção nos exemplares suplementos especializados onde há mais calibre, mais profundidade. O Times, de Londres, ou o The New York Times são prova disso,convidando grandes nomes para tais tarefas. Mas isso não tem nada a ver com a crítica opiniática que havia aqui”.
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/08/1986 – Beatriz Marinho
|