"Se eu fosse escolher uma influência, talvez convocasse Mário de Andrade. Gosto do jeito dele escrever meio como quem não quer nada, como se estivesse contando a história a uma pessoa próxima, sem se preocupar com o estilo. Depois é que a gente vê como ele o trabalha. Há um conto que levou dezessete anos para ser concluído. Por isso que deixou apenas dois livros fundamentais para o conto brasileiro: Contos novos e Contos de Belazarte. Outro que foi um dos motores para eu começar a escrever foi José J. Veiga, hoje infelizmente esquecido. Acho que vem dele o narrador infantil que tanto prezo. O narrador-criança é interessante porque, como ele vê o mundo de certo ângulo, sempre ficam sombras que criam no leitor espaços que devem ser preenchidos pouco a pouco. O universo infantil é todo cheio de mistérios porque a criança não tem pleno entendimento das coisas (como se a gente tivesse...). O terceiro escritor que me impulsionou foi Clarice Lispector, da qual acho que não tenho nada, o que é bom. Quando li Clarice pela primeira vez senti que ela dizia coisas que ninguém até então havia dito para mim e eram tão verdadeiras, mesmo que intangíveis. Laços de família é um livro que todos deviam ler. Aliás, tudo o que ela deixou. A descoberta do mundo, seu livro de crônicas, está sempre ao alcance da minha mão. Fora esses, tem Gabriel Garcia Márquez, mas é só admiração pela facilidade como ele conta uma história, algo que não tenho. Tendemos a preencher com as virtudes do outro aquelas que não temos. Se eu fosse pensar em acidez e humor, pensaria em Nelson Rodrigues. Às vezes acho que tenho algo dele, sobretudo na descida ao que o ser humano tem de mais sórdido, escabroso, escondido.
Fonte: www.carlosribeiroescritor.com.br/especial_revista_antoniocarlosviana