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Jornalismo
Antonio Fernando Borges

"De um lado, a prática diária de escrever é sempre benéfica a um escritor: quem escreve sempre melhora de quinze em quinze minutos, como disse (mais ou menos assim) Nelson Rodrigues. Benéfica também (num plano mais circunstancial) é a projeção que a mídia pode dar à carreira do escritor. Como se trata de uma categoria bastante corporativa, estar dentro da imprensa pode ser meio caminho andado para ‘passar pro outro lado do balcão’ — quer dizer, virar notícia. O lado negativo: a imprensa, como se sabe, substitui essencial pelo contingente, o universal pelo conjuntural e o eterno pelo histórico. A convivência permanente e diária, durante anos e anos, com a banalidade e a frivolidade da chamada ‘vida como ela é’ pode limitar o horizonte intelectual do escritor, cujo compromisso me parece ser, acima de tudo, com o mergulho nos ‘mistérios metafísicos’ da vida. Nem é à toa que a literatura moderna (não só no Brasil, mas em todo o mundo ocidental) é dominada por escritores que privilegiam o realismo ‘descritivista’ voltado para problemas sociais, quer dizer, circunstanciais. Mas, para ficarmos no âmbito brasileiro contemporâneo, eu daria dois exemplos de escritores ‘soterrados’ pelo exercício diário/profissional do jornalismo: Nelson Rodrigues e Paulo Francis — ambos melhores no jornalismo do que na ficção... Jornalismo é um ofício que requer especialização e adestramento, como toda atividade ‘artesanal’. Mas claro que para muita genteela também representa uma nobre vocação — e dasmais românticas. É o caso do repórter, que sonha em buscar a verdade dos fatos, como o filósofo (na verdade, o intelectual, em geral), procura buscar a verdade, sob ou para além dos fatos. Pena que o diaa- dia das redações e os interesses extraverdade se encarreguem de jogar por terra os melhores sonhos de qualquer um. Aí, as alternativas são: a fuga, a submissão ou (pior dos casos) um amargo cinismo. E a literatura? Tirando as exceções de quem busca apenas prestígio, dinheiro ou o domínio de mais um instrumento para “transformar o mundo” (caso da literatura engajada), não há dúvida de que a literatura é uma nobilíssima vocação. Para se ter uma idéia: no imaginário da Idade Média, o escritor/poeta era considerado uma das ‘quatro formas superiores de existência’ (superiores em termos espirituais, bem entendido), juntamente com o religioso, o filósofo e o guerreiro".

Fonte: COSTA, Cristiane H. <www.penadealuguel.com.br>,

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