"Realidade. Indignação. Incômodo na barriga. Ansiedade. Muita ansiedade. Escrita. É desta forma que se manifesta meu ‘brain storm’, desenvolvendo, conseqüentemente, textos que em geral possuem como assunto principal a cultura, mas como tema presente e latente a política. Ora, nada que qualquer autor escreva ou qualquer pessoa fale pode estar simplesmente desvinculado da política, mesmo que obliquamente e mesmo sem querer. A arte de guiar e influenciar, muitas vezes, não está no objetivo primordial, mas desde que nascemos estamos em contato e conflito com a opinião do outro. É por isso que aprendemos que devemos respeitar o juízo do próximo (cada cabeça uma sentença). Em livros como o Equador, de Miguel Souza Tavares, percebe-se que questões políticas e culturais se misturavam explicitamente, e que nas questões culturais havia, implicitamente, uma crítica à sociedade burguesa, que, por sua vez, era um reflexo político da época. Já no livro O Tenente Quetange, de Iuri Nicolaievitch Tyniánov, nota-se uma crítica à burocracia estatal, mas esta nada mais é do que um espelho dos governantes e suas nuanças políticas. Cabe, então, ao processo cognitivo e ao cidadão consciente refletir qual é o real objetivo do texto examinado. O que exatamente cada autor está querendo expressar e manifestar? E, uma dica, qual é a história de vida daquele escritor? Sendo eu o objeto deste depoimento, confesso que gosto de observar a realidade. Ver o que eu faria se fosse um ministro, empresário, sorveteiro, pipoqueiro, e, porque não, político em Atenas. Aprecio e me divirto criticando. Não criticar negativamente, mas criticar sugestivamente e, tentando, com humildade e às vezes nem tanto, apontar o segundo ponto de vista sobre a obviedade, sobre o dogma, sobre o que é certo, mesmo que a minha opinião não seja a corrente majoritária. Ora, críticas são sempre bem vindas. Quanto mais penso, mais críticas tenho a fazer de mim, da situação ou da oposição. É neste caminho que minha indignação desaparece, minha dor na barriga some, e minha angústia toma forma e é pulverizada no prazer de escrever e me comunicar".

Fonte: Depoimento obtido em 9 de maio de 2007.