"(O cinema) é uma cultura difusa porque é confusa; quero dizer que há no cinema uma espécie de jigajoga possível de valores: os intelectuais põem-se a defender filmes de massas e o cinema comercial pode absorver muito rapidamente filmes de vanguarda. Esta aculturação é específica da nossa cultura de massas, mas tem um ritmo diferente conforme os gêneros; no cinema, parece muito intensa; na literatura, as fronteiras estão muito mais bem gruardadas; não acredito que seja possível aderir à literatura contemporânea, a que se faz, sem um certo saber e mesmo sem um saber técnico, porque o ser da literatura se colocou na sua técnica. Em suma, a situação cultural do cinema é atualmente contraditória: ele mobiliza técnicas, daí a exigência de um certo saber, e dum sentimento de frustração de não o possuirmos, mas o seu ser está na sua técnica, ao contrário da literatura: são capazes de imaginar uma literatura verdade, análoga ao cinema-verdade? Com a linguagem, isso é impossível, a verdade é impossível com a linguagem."
Fonte: BARTHES, Roland. O grão da voz. Lisboa: Edições 70, 1982. (Extraído de uma entrevista publicada no Cahiers du Cinema, nº 147, set./1963.
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