"No meu caso a filosofia inibiu a poesia − falo em poesia no sentido grego da palavra, o de criação literária − por dar demasiada predominância ao conceito, ao pensamento abstracto, de que a arte não precisa....Versejar não é poetar. Parménides escreveu o seu famoso tratado em verso e já Aristóteles dizia que, lá por ter escrito em verso, Parménides não era poeta! Heraclito, pelo contrário, escreveu prosa, e é o mais poético dos filósofos. Dele só chegaram até nós cento e tal frases fragmentárias, mas a sua visão metafórica e a sua dicção elevada, oracular, estão mais próximas da poesia, de poetas como Ésquilo. No tempo deles não havia uma distinção nítida entre pensar e poetar. Com Sócrates e os seus discípulos a razão começou a dominar, a oprimir aquela bela espontaneidade pré-socrática, a ponto de, muitos século depois, no Nascimento da Tragédia, Nietzsche dizer que quem matou a tragédia foram Sócrates e Eurípides, seu discípulo. Não há uma regra geral, mas no meu caso a filosofia foi mais nefasta que propícia, perdi muitos anos a estudar para dar boas aulas... Quando estudo filosofia não sinto a necessidade de ficcionar".
Fonte:
http://alfarrabio.di.uminho.pt (12/10/2012)
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