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Cinema
Daniel Galera

" Tu dizes: 'ah, o cinema tem personagens melhores'. Mas podes apontar vários grandes personagens do cinema recente que foram baseados em livros. O assassino do filme dos irmãos Coen (“Onde os fracos não têm vez”) é baseado no romance do (Cormac) McCarthy, é um personagem literário, primeiro... Então, não sei se eu concordo contigo, não porque eu discorde, mas porque não sei mesmo... (risos). Mas não me parece que a literatura esteja tão defasada no sentido de oferecer grandes personagens hoje em dia... Talvez seja mais o contrário: a falta de grandes personagens seja mais sintoma da estética mais documental de hoje. Existe uma tendência, nas últimas décadas, de uma estética cada vez mais realista. Tivemos o Realismo, no sentido de representar a realidade através da ficção, o Naturalismo, no sentido de parecer o mais próximo possível do que realmente é, e hoje já vivemos algo depois disso, além do Naturalismo, em que tem que ser o que é de fato, não uma representação muito fiel do que é. As pessoas querem que seja verdade, de alguma forma. Leem livros e veem filmes querendo saber em que aspecto da realidade aquilo foi baseado, e vão querer conferir depois na internet, no extra do DVD ou numa entrevista do escritor exatamente qual situação real deu origem àquilo. Parece que se a ficção não tiver mais um substrato na realidade ela não tem valor. É um fenômeno bem do nosso tempo. O leitor lê muito assim, e acho que qualquer escritor que publique hoje tem um depoimento assim: de como o leitor parece fascinado em querer saber de onde vieram as coisas que ele leu... E se tu dizes que inventaste, ou não dizes de onde veio, as pessoas às vezes ficam irritadas e até inventam de onde veio. Elas têm que construir essa ponte com a realidade, senão parece que ficam perdidos, que algo falta. E claro que a arte está toda envolvida nesse processo: a própria evolução técnica do cinema e da TV tornou esses meios mais fiéis à realidade. Talvez essa sensação de que os grandes personagens de ficção são em menor quantidade hoje se deva a esse fenômeno cultural, de encontrar pontes entre as histórias e a realidade. Não sei explicá-lo, mas é inquestionável que ele acontece... Sobre Cachalote não existe nada programado. Mas os direitos de adaptação estão vendidos, tem gente tentando produzir. Talvez haja mais probabilidade de virar um filme, mesmo, com atores, do que uma animação. Algum tipo de adaptação, acho que vai ocorrer.

Fonte: www.minimomultiplo.com 06/06/2011)


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