"No que tange à poesia que escrevo, levando-se em consideração que até aqui priorizei a minha criação em prosa ficcional, só tenho a acrescentar – já que quero ser bem breve em minha resposta – haver duas forças (às vezes conflitantes, ás vezes complementares) nesse atávico ofício. Há os poetas que, como arquitetos, se predispõem a encontrar nos dados físicos das letras, espaços, sons, silêncios, folha em branco, pictóricas paisagens letradas, desenhos, palavras, sintaxe etc. a sua expressão. Eles a constroem como um perfeito pedreiro solitário, que, passo a passo, busca o material disponível para (re)construir algo em que ele, ao fim, se possa apoiar e, quem sabe, mais uma vez, (des)construir. Há, por outro lado, os autores que se fiam mais no que João Cabral de Melo Neto chamou do “voo do pássaro aprisionado”. Aprisionado não o pássaro, mas o voo – fique bem claro. O pássaro é sempre livre. São aqueles que buscam a inspiração do inefável, e precisam respirar com os ares da não-matéria. Creio que, no meu caso, ambas as formas de se fazer poesia estão presentes no que manifesto. Ora, preciso da matéria, como pedreiro. Ora, necessito ultrapassar o físico, de tal forma que parece que ele nunca existiu. Fartamente me vejo enfurecido por uma rima, um compasso estreito e perfeito, um esquadro retilíneo, uma chave-de-ouro, um preciosismo, uma labareda de vulcão artificial. Não menos fartamente me largo das regras sirgadas do poeta-arquiteto e me deixo singrar aos oceanos como uma nau destituída de leme e manche. Simplesmente vou. Ou voo. Impossível dizer o que me dá maior prazer, como é impossível dizer do que o ser humano precisa mais: ar ou água. Construir é erguer no ar. Levar-se é flutuar nas águas. Do resto, nada sei".
Fonte: Depoimento obtido junto ao autor em 02/04/2009
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