"Às vezes, escrevo na ordem de publicação, às vezes adianto algumas partes que já estão bem resolvidas e deixo outras, anteriores, mais complicadas para depois. Às vezes começo sabendo o final; outras, só vou descobrir quando chega a hora. E quando me canso de uma história, começo a escrever outra. Tenho que estar sempre com o desejo aceso por aquela história. Se você perde o desejo, a história não sai... Os personagens têm algo a ver comigo, mas não são autobiográficos. Posso emprestar a eles alguma coisa pessoal minha. Eles representam, na verdade, a minha vida interior, as coisas que me impressionam, as minhas reflexões, os sentimentos mais profundos dentro de mim. Podem ser inspirados em pessoas que vejo na rua, como Inês, a manca, ou numa categoria profissional, como o Antonio Martins: ele é uma gozação aos críticos conservadores... Não tenho horários rígidos, mas gosto de escrever de manhã, logo que a cabeça desperta. Sento na cadeira de balanço e vou em frente até a hora que me canso. Às vezes, escrevo também à tarde. À noite, gosto de deitar relativamente cedo, para ler. Não tenho mais saco para a vida noturna. Antes, tinha saúde para tudo. Agora, uma ressaca dura 48 horas. Não dá mais para conciliar vida caótica com literatura... A história é alguma coisa que aflora ao consciente. A novela Uma Carta, na qual uma mulher escreve ao homem praticamente desconhecido com quem transou, nasceu de uma imagem: uma carta fechada dentro de um saco nos Correios. Ela está lá, pulsando, talvez cheia de amor ou de tragédia, mas ninguém sabe ainda. A partir daí, imaginei quem teria escrito a carta e quem seria o destinatário. Decidi que o remetente era uma mulher e escrevi a novela na primeira pessoa, com intensidade máxima. Há coisas minhas naquela mulher. E coisas de outras mulheres, que minhas amigas me contaram".
Fonte: Correio Braziliense, 28/12/1997 - José Rezende Jr.
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