(Comentário sobre a imagem que se tem do livro O esplendor de Portugal, como um livro folhado, em que se colocam camada sobre camada) “A estrutura é musical, sempre. Normalmente, o que um romancista faz é utilizar uma narrativa. Quando você tenta dinamitar o romance o que para mim é mais importante é tentar fazer sem a narrativa. Tento escrever um romance sem o fio da narrativa. Erguer personagens, erguer emoções, sentimentos, sem a ajuda desse fio narrativo. O romance cresce como uma pedra que cai num poço e vai formando circuitos concêntricos”.
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/11/1999 – Jair Rattner
(Comentário sobre a estrutura musical do livro A ordem natural das coisas) “A estrutura de meus romances é sempre musical. Infelizmente, a crítica literária quase não dá atenção a isso. A ordem natural das coisas, lançado em Portugal em 1992, é o segundo livro de uma trilogia que começou com o Tratado das paixões da alma e se encerou com A morte de Carlos Gardel. Há, por trás desses três livros, um pano de fundo musical. A morte de Carlos Gardel chega a ter a mesma estrutura da Quinta Sinfonia de Gustav Mahler. Mas ninguém se importou com esse aspecto decisivo... (Quanto A ordem natural das coisas, em que peça musical é espelhado) eu não saberia responder a essa pergunta. Lembro-me de Gardel porque ainda é um livro recente e também porque a presença de Mahler foi muito forte, mas com o tempo todas as referências, para mim, se apagam. De todo modo, você está correto quando observa a estrutura musical desse romance. Talvez haja uma influência da música árabe e da africana, que estão muito presentes em Portugal. A lógica africana arruína a nossa noção européia de tempo. Ela não tem passado, presente e futuro, mas apenas um presente elástico, que contém os três tempos dentro de si. Logo, essa influência me permitiu jogar muito mais com o problema do tempo que é, em essência, o grande problema do romance”.
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/04/1996 – José Castello
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