"Às vezes me sinto como um dinossauro, um representante de uma idade perdida da Terra. Outras vezes me sinto desamparado, solitário. E, em outras, sinto o contrário: que esta crise, como toda crise, pode ser fecunda, e que no fundo o que está sendo enterrado é a usurpação burocrática do socialismo, e não o socialismo. Eu pertenço a uma geração de escritores do Rio da Prata que emergiu e atuou num período muito atormentado da vida do Uruguai e da Argentina, onde vivi a primeira parte de meu exílio (1972-1976). Muitos dos membros dessa geração de escritores ficaram pelo caminho – assassinados ou desaparecidos, ou condenados a se calarem para poderem sobreviver, o que é uma forma de crime ou de suicídio. Reconheço que em muitas coisas essa geração se equivocou. Mas algum dia será preciso dizer, para desculpá-la ou compreendê-la, que, seja como for, terá sido sempre uma geração que se equivocou por paixão e não por dinheiro. Creio que nós, escritores dessa geração, estivemos muito vinculados com todo movimento popular e social que quis entrar na história com muito ímpeto. Cometeu muitos erros, mas agora, vendo as coisas em perspectiva, e num momento de crise e de desamparo, continua acreditando que é melhor se equivocar por paixão do que acertar por dinheiro. E o mundo que estão nos oferecendo, a partir da crise da esquerda, do desmoronamento do chamado ‘socialismo real’ dos países do Leste, é o mundo que propõe a fé no dinheiro como única fé possível”.
Fonte: Nossa América (SP), n.4, dez. 1997 – Eric Nepomuceno |