"É o seguinte, o signo que tento trabalhar é o da intensidade. Não tenho medo, nem tento fazer uma poesia onde doure a pílula, sempre otimista. Tento fazer uma poesia como me sinto. Tanto minha sensibilidade como meu pensamento vão aos solavancos. Uma forma muito similar a de um epiléptico. O que tento ser é o mais colado aquela sensação e pensamento no momento em que eles se dão. O reino que preside é o reino da intensidade, mas sem cair no ingênuo, no naive. Não tenho medo dessas separações bipolares como otimismo/pessimismo. Não tenho medo do irrespirável, do abismal, do abissal. Eu me providencio um um escafandro e sei descer a regiões abissais, como sei também trafegar no superficial e me elevar em vôos, como no poema Orfeu do Roncador. Os poemas surgem de um ponto, mas esse ponto inicial é muitas vezes borrado. Às vezes, ele é supresso do texto, nem aparece depois. eu me sinto parecido com um calígrafo de uma idade de ouro da humanidade, que foi o califado de Córdoba, na Espanha, na Idade Média. Para mim, esse é um grande período da história, quando a convivência de judeus, cristãos, árabes, geômetra-matemáticos e poetas se davam de uma forma plena. Eu me sinto um calígrafo dopado desse período. E o poema, muitas vezes, surge como um fragmento de um resgate de um momento onírico, mas - repare bem - não acredito em inspiração. Inspiração não é banana, que plantando dá. O momento inicial muitas vezes é denegado. Ele só dá o início. Posso até reconhecer uma persistência romântica, como digo num dos poemas do livro, mas - olhe bem - superpenetrado de uma ironia modernista".
|