“Acordo por volta das 5h e vou caminhar pelo deserto próximo a minha casa. O deserto coloca as coisas nos seus devidos lugares: dá-nos um sendo de proporção, de critério. Todo mundo deveria ter uma experiência sensível dessa proporção. Depois tomo café e vou escrever. Uso sempre caneta, pois gosto de senti-la entre os dedos. Escrever é um ato sensual. Depois do almoço, às vezes, desfaço tudo e reescrevo. Sou uma pessoa mais do dia do que da noite”.
Fonte: Folha de São Paulo, 26/12/1999 – Luiz Felipe Pondé
"Como eu disse, acordo muito cedo. Após minha caminhada no deserto, sento-me à minha mesa. Por volta das 6h, já estou trabalhando. Para mim, o melhor horário para trabalhar é de manhã. Trabalho a manhã inteira, às vezes escrevo só uma frase, mas trabalho a manhã toda. Então, faço uma sesta e, à tarde, destruo o que escrevi de manhã. Essa é a minha rotina... Costumo ser muito monógamo. Trabalho uma obra de cada vez. Não consigo escrever duas obras ao mesmo tempo. E, quando trabalho numa obra, ou escrevo ou desisto. Sim, na minha história, houve mais abortos que nascimentos. Essa é a minha história. Há muita coisa que comecei e nunca terminei. Mas, quando trabalho numa obra, não faço outra coisa. Às vezes, passo a manhã sentado, esperando. Por muitos anos, eu me senti culpado por ficar sentado sem produzir, sobretudo quando eu vivi no kibutz, onde todos faziam a ordenha e outras coisas, enquanto eu escrevia uma frase e jogava fora. Eu tinha vergonha de ir comer. Então, desenvolvi a mentalidade de um lojista. Eu dizia a mim mesmo: meu trabalho é abrir a loja às 6 da manhã, sentar-me e esperar clientes. Se eu tiver clientes, será um bom dia. Se não os tiver, mesmo assim estarei trabalhando... Normalmente há uma breve sesta entre elas. De manhã, fico sozinho no meu escritório: nada de telefone, conexões ou seres humanos. Só eu e meus personagens. À tarde e à noite às vezes faço outros trabalhos, escrevo ensaios ou artigos, faço discursos, compareço à noite diante do público. A sesta divide minha vida entre a vida privada".
Fonte: Programa Roda Viva, da TV Cultura, 05/07/2007
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