"A principal desculpa já é muito conhecida: é a famosa história da 'arte social'. Certos artistas brasileiros descobriram de repente em sua ignorância que a arte deve ter uma função social. Ora, a arte sempre teve função social. Nasceu como coisa social e sempre viveu como coisa social que é. Mas, escudados nessa descoberta de que arte é coisa social, muitos dos nossos artistas têm feito da arte um exclusivo instrumento de combate. Ainda estou de acordo com eles. A arte pode ser evidentemente um instrumento de combate e aí estão admiráveis instrumentos de luta como o "Inferno", de Dante, o D. Quixote, de Cervantes, o Guerra e Paz, do Tolstoi, e tantos mais. Porém, o que ninguém pode negar é que todos estes combatentes foram admiráveis artistas e que é justamente pela beleza, de exposição formal do seu pensamento que eles adquiriram o valor de combate que têm. Eu também estou convencido, jamais neguei emtoda a minha vida, que a arte tenha um valor social".
Fonte: ANCONA LOPEZ, Telê Porto: Mario de Andrde: entrevistas e depoimentos. São Paulo: T.A. Queiroz, 1983.
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"Nós vivemos eternamente adquirindo convicções novas e num etemo trabalho de reeducação de nós mesmos. O que eu quero dizer é que se o artista está convencido de que, nesta horrível atualidade, ele deve participar das lutas sociais também com a sua arte, ele não deve se arrepelar com o fantasma bobo da insinceridade. Force um bocado e se reeduque numa sinceridade maior. Ele já não fez tantos poemas individualistas, tantos contos gratuitos que jogou fora por malsucedidos? Que mal há que jogue fora mais alguns exercícios de... espírito social, até acertar a mão? O poeta, o artista está educado por século e meio de arte gratuita, não-participante, socialmente conformista, distanciadora de classes, a serviço da classe dominante e para gozo dela. Pois cabe a ele, é seu dever, se reeducar".
Fonte:
SENNA, Homero. República das letras. 3ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996
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