Fonte: Folha de São Paulo, 26/09/1996 – Cynara Menezes
"Acho que literatura serve para ser literatura. Não sou engajada. Acho, pelo contrário, que a obra de arte engajada se abastarda; o escritor não tem direito de ser engajado. Se ele tem aquela convicção e se ele dá um testemunho do que viu e do que sente, muito bem. Mas se faz uma literatura com visgo de propaganda, engajado numa ideologia, porque é a ideologia dele, então ele ajeita a obra de arte dele a serviço daquela ideologia, não respeito essa obra de arte e não respeito esse estilo do artista. Naturalmente, se o Picasso fez Guernica é porque a Guernica não era uma obra engajada, era um testemunho terrível daquele acontecimento também terrível, então isso... está tudo bem. Mas, se o Picasso começasse a pintar retratinho do [fulano] porque o sujeito era libertador, foi libertário, dentro de qualquer ideologia, a serviço de qualquer ideologia, sou contra. Acho que a gente tem que dar o testemunho fiel do seu tempo e da sua gente e as conclusões que sejam tiradas... Justamente a minha própria história literária justifica essa minha posição, nunca fiz um livro engajado. O meu cenário é o Nordeste, o único livro que escrevi que não se passou no Nordeste foi O galo de ouro, que era num subnordeste nesse tempo, o Rio de Janeiro, a Ilha do Governador, que era muito parecida com o Nordeste. Eu morava lá, foi um livro de encomenda, mas que fiz com carinho e com interesse. E nunca saí do Nordeste. E a isso tenho sido fiel, nunca me contradisse, creio. Não defendo absolutamente a validade literária da minha obra. Agora, as minhas posições, em relação ao meu testemunho, defendo com certa veemência".
Fonte: Programa Roda Viva, da TV Cultura, 01/07/1991