"Escrevo datilografando, geralmente na velha máquina onde escrevi todos os meus livros. Tenho máquina elétrica, mas uso-a mais para copiar o que já fiz e para escrever artigos de jornal. A máquina elétrica produz um leve zumbido. Esse zumbido parece que me apressa, tenho a sensação de que a máquina, impaciente, fica à espera de minha frase, de meu pensamento. Isso inibe. A velha máquina, em seu silêncio, ajuda. Sabe que escrever não é fácil e que há um tempo certo para a criação de cada frase. Algumas vezes tomo nota à mão. Planejo os livros antes, detalhadamente, como no caso de Avalovara (fiz três gráficos), ou de forma mais simples, como para os outros livros. Sempre há um plano básico ou diversos planos básicos com a margem natural para o imponderável. A rainha dos cárceres da Grécia teve um esquema quase oposto ao de Avalovara. O esquema de Avalovara, de certo modo, não era afetado pelo tempo. A rainha dos cárceres da Grécia, romance escrito em forma de diário, foi sendo datado exatamente de acordo com os dias em que estava sendo escrito, tratando-se de uma obra estritamente relacionada com os acontecimentos de cada dia. Avalovara remetia à ordem cósmica. A rainha dos cárceres, sem recusar as preocupações com o universo e o eterno, é mais voltada para o cotidiano, o temporal, o efêmero. Um contraste e uma continuidade. Próprios de minha inquietação. Para mim, o ato de escrever é um ato de descobertas. Daí a necessidade do esquema inicial e da margem para o imponderável. Antes de começar a escrever é como se o mundo fosse negro. Escrevendo vou desvendando os caminhos que pretendo alcançar".
Fonte: STEEN, Edla van. Viver & escrever 2. Porto Alegre: LP&M, 2008.
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