ALEJO CARPENTIER
Entrevistado por Alexis Márquez Rodríguez, para o jornal El Nacional, de Caracas, de 10/06/1979 e publicado no livro Entrevistas: Alejo Carpentier. Havana: Editorial Letras Cubanas, 1985, de onde foi extraída.
***
Lilia e eu iremos a Caracas numa viagem estritamente privada, passar umas duas ou três semanas com nossos amigos, sem compromissos de nenhum tipo: nem conferências, nem entrevistas, nem coletivas de imprensa... Como dois simples turistas... Assim escreveu Alejo Carpentier a um amigo ao anunciar-lhe sua visita a Caracas, após quatro anos de sua viagem anterior, quando veio convidado pela Universidade Central. Nessa oportunidade teve um programa de trabalho bastante intenso. Esta vez – insistiu com os jornalistas que foram recebê-lo no aeroporto – queremos descansar: nada de entrevistas.
Está bem, rapaz, você sabe sobre minha determinação nesta viagem. Mas eu não posso negar uma entrevista a El Nacional. Você sabe que eu estive muito ligado a esse jornal durante meus quatorze anos de vida em Caracas. Além disso você e eu podemos conversar um pouco sobre tudo, sem ordem nem programa e assim, como quem não quer nada, a entrevista vai saindo...
Alejo Carpetier está a caminho dos 75 anos, que se completarão em dezembro. No dia 26 para ser exato. O admirável é que nessa idade e sendo um funcionário cujas atividades diplomáticas em Paris lhe absorvem muito tempo, esteja em pleno processo criativo. O ano passado saiu o que até agora é seu romance mais ambicioso: La consagración de la primavera, um volume de mais de 500 páginas que já se encontra na sexta edição. Agora acaba de sair – ainda não chegou em Caracas – El arpa y la sombra, novela de 226 páginas, como o livro anterior, editado pela Siglo XXI em duas edições simultâneas: México e Espanha. Esta novela se relaciona com o fato de que a canonização de Cristóvão Colombo foi proposta em três ocasiões. Na última vez, respaldado por 850 bispos, acabou na ruidosa recusa do candidato, julgado pela Igreja indigno de figurar entre os santos. Esta é a história contada na novela... E não te digo mais para manter um pouco o mistério que atrai os eitores.
A propósito de La consagração da primavera, foi escrito recentemente, aqui em Caracas, que se trata de um romance chato e que faz concessões inaceitáveis ao chamado realismo socialista. Qual sua opinião a respeito?
Bem... os romances não têm por quê ser divertidos. Se fosse assim, o cúmulo do romance divertido seria Corín Tellado. Além disso eu não creio que existam romances chatos. A chatice não está no livro, e sim no leitor, na qualidade do leitor...
E quanto ao realismo socialista?
Eu creio que o realismo socialista não pode ser condenado em bloco. Como em todas partes, ali existem obras boas e obras más. Obras mestras do realismo socialista são El tren blindado, de Vsevolod Ivanov, e Tashkent, cidade de la abundancia, de Erveinov. Como também El Don apacible, de Sholojov. Inclusive muito antes de se falar em realismo socialista, um romance como Germinal, de Zola, é um brilhante exemplo de realismo socialista...
À medida que a conversa se desenvolve, Alejo Carpentier vai mostrando seu entusiasmo. Suas enormes mãos se movem agilmente em giros envolventes. Para ele está claro que em La consagración de la primavera não há nada de realismo socialista, ainda que ele insista que não tem nada contra tal corrente estética.
Em minha novela não há pregação. Não há um só personagem que pare e diga que as coisas devem ser assim... O que há são acontecimentos em desenvolvimento.
Com frequência se critica a Revolução Cubana por uma suposta falta de liberdade para a criação intelectual. Sem dúvida, Carpentier não é o único escritor que se entregou a ela com fervor. É indubitável que a maioria dos escritores e artistas cubanos são afeiçoados a Revolução. Perguntamos a Carpentier como se explica essa aparente contradição.
Muito fácil... – responde com ênfase –, Depois de uma história republicana que se inicia em 1902, o intelectual era tido em meu país como um ser negativo; inclusive para uma certa burguesia, como nocivo. Pela primeira vez, a Revolução confia aos intelectuais missões úteis. Em meu caso, jamais fui levado em conta como fui a partir da Revolução, que me encomendou diversas funções, até chegar ao meu atual posto diplomático...
A propósito – interrompemos-o – muita gente se pergunta por que, dado sua categoria intelectual, é somente Ministro Conselheiro, e não Embaixador...
Por uma razão muito simples. Em Paris, Cuba centraliza uma série muito importante de atividades do tipo cultural para toda a Europa. Eu, como Ministro Conselheiro para assuntos culturais, tenho que coordená-las. Viajo muito a conferências, exposições, apresentações cinematográficas, cursos universitários... Tenho estado, nesta missão, em quase todos os países da Europa Ocidental e em todos os países socialistas. Minha experiência no campo da cultura me facilita o trabalho...
Passando a outro tema, qual a sua opinião sobre Jorge Luis Borges?
Ninguém pode negar que Borges é um dos narradores mais originais e importantes da língua castelhana. Agora, parece – e muita gente o vê assim – que Borges foi descoberto há 20 anos. Não. A geração vanguardista – a minha – dos anos vinte já conhecia Borges. E o admirávamos. Infelizmente Borges cultiva um tipo de veleidade verbal, que se ele tivesse a graça de Dalí, talvez fosse tolerável. Uma vez perguntaram sua opinião sobre Dom Quixote, e ele disse que só conhecia em sua versão inglesa... Isto, dito por Dali, ficaria engraçado. Dito por Borges é uma estupidez.
Em que se baseia essa diferença?
Em que, não obstante Dali ser detestável como pessoa, pelo menos é engraçado. Mas Borges é carente nessa área. Uma carência agravada por uma atitude política extremamente reacionária, que leva-o ao extremo de congratular-se com Pinochet... Atitude indigna do espírito que sempre animou a intelectualidade latino-americana.
Há alguns meses estreou em Paris a versão cinematográfica de El recurso del método. Na Venezuela ainda não foi apresentada. Quando ainda estava em processo, Carpentier nos falou em várias ocasiões com grande entusiasmo do filme, cuja filmagem acompanhou de perto. Queremos saber sua opinião agora, já terminada e em exibição.
Eu, como autor do livro, tenho algumas reservas sobre certas passagens. Sem dúvida, o filme teve um grande êxito na Europa. Em Paris já entrou na 11ª semana de exibição. Foi o primeiro filme latino-americano que conseguiu entrar nos grandes circuitos de distribuição. Antes, nossos filmes tinham que conformar-se com salas pequenas, as que eu chamo “cinemas um pouco confidenciais”. El recurso del método estreou simultaneamente em oito salas, entre elas algumas das maiores de Paris...
Voltando um pouco sobre La consagración de la primavera, existem outras duas acusações que têm sido feitas. Uma refere-se a sua erudição. Outra é que a obra reflete um compromisso político que o sr. havia perdido como romancista. O que o sr. acha?
Quanto a primeira, o que os críticos europeus consideram como uma qualidade nas minhas novelas, resulta, para alguns de meu continente – não para todos – uma falta grave... Sem dúvida, esses mesmos críticos se sentem muito ofendidos se alguém insinua que não leram Proust, Joyce, Thomas Mann, Malcolm Lowry, autores já não eruditos, e sim mais enciclopédicos, Além disso, me parece que se confunde erudição com cultura. Eu diria que minhas novelas não são propriamente eruditas, e sim cultas...
O que nos obriga a pedir-lhe uma definição de cultura...
Muito fácil... Respondo com a definição que dei recentemente numa conferência em Yale: mais ou menos, “provisão de conhecimentos que permite estabelecer relações além do tempo e do espaço, entre duas realidades semelhantes, explicando uma em função de suas similitudes com outra que pode ter existido muitos séculos atrás”. Isso é o que permite a Malraux, olhando um admirável retrato japonês de seis ou sete séculos, revelar-nos que esse retrato responde aos mesmos mecanismos de composição de um quadro cubista de 1910.
E quanto ao compromisso político? Para Carpentier não há coisa mais falsa que pretender que o compromisso política prejudica o artista.
É preciso lembrar que o quadro mais famoso deste século é o Guernica, de Picasso, e que o quadro mais famoso do Romantismo francês é A Marselhesa, de Delacroix, que é pintura “de barricadas”. Os exemplos poderiam multiplicar-se na pintura, na música, na literatura... É totalmente falso que o artista que se compromete politicamente na obra perde qualidade! Conclui taxativamente.
No capítulo inicial de Los pasos perdidos, o sr. faz uma descrição dramática de Nova Iorque – sem nomeá-la – como uma cidade desumanizada. Recentemente esteve de novo lá, depois de muitos anos. Que impressão causou ao romancista esta nova visita?
- A Nova Iorque que eu pinto em Los pasos perdidos, que é a mesma que pinto em La consagración de la primavera, corresponde aos anos 40. Pois bem, direi que a Nova Iorque que encontrei agora, depois de 30 anos, está ainda mais deteriorada. É uma cidade mais caótica, mais apocalíptica, mais desumana... Por outro lado, Yale – a Universidade – é uma grande concentração de estudantes, professores e pesquisadores muito interessante; muita gente progressista. Eu me senti muito bem ali. Existem alguns catedráticos cubanos, como José Juan Arrom e Roberto González Echeverría, que, não obstante, estarem fora de Cuba há muito tempo, estão totalmente identificados com a Revolução Cubana e lhe dão respaldo com grande entusiasmo...
Trabalha em algum novo livro?
Estou metido num tema que me apaixona: a história, sem dúvida realmente maravilhosa, de Lídia e Clodomira, duas heroínas da Revolução Cubana que foram – são – dois seres extraordinários. Duas mulheres do povo, muito humildes. Uma delas inclusive era analfabeta. Foram “correios”, uma do Che e outra de Fidel, quando eles estavam na Sierra Maestra. Um dia foram presas, um pouco por casualidade; pois não sabiam quem eram. Foram torturadas até a morte. Mas seus algozes não conseguiram arrancar-lhes nada, nem chegaram a inteirar-se da missão que cumpriam. A história de nossa América está cheia destas pessoas admiráveis.
A amizade de Alejo Carpentier com Miguel Otero Silva foi determinante para que esta entrevista fosse concedida a El Nacional. Uma velha amizade, de remotos tempos em que ambos, exilados, viviam em Paris. Por outro lado, Miguel Otero Silva acaba de publicar um romance sobre o tirano Aguirre que está sendo muito comentado. o sr. o leu?
Li com grande interesse e me parece excelente. Miguel consegue algo que neste romance era muito difícil, como é mobilizar uma enorme quantidade de personagens secundários que o tirano Aguirre vai colocando em sua órbita. Me parece que Miguel resolveu de modo magistral como personalizar esse monte de gente. Um capítulo antológico é a aparição de Inês Atienza. Ela sozinha dá um romance, a partir do romance de Miguel...
x.x.x.
Alejo Capentier entrevista Jean-Paul Sartre
De sus entrevistadores, quizá uno de los más memorables sea el escritor, ensayista, musicólogo, y periodista, Alejo Carpentier, quien sostuvo una charla en Cuba con el autor de La Náusea, en 1961, y que fue reproducida en la Revista de la Universidad de México, ese mismo año, y que más tarde fuera rescatada por el escritor e investigador cubano Virgilio López Lemus, en el libro Entrevistas, Alejo Carpentier, que publicó Editorial Letras Cubanas.
Bajo ese mismo título, es decir, "Una conversación con Jean Paul Sartre", bautizó el autor de El reino de este mundo el encuentro con el francés, a quien en la introducción del texto describe como aquel intelectual francés que a su vez era descrito como aquel que "no era
una mercancía destinada a la exportación". Por aquellos años Sartre visitó la Cuba revolucionaria, que entonces presentaba los avances de su desarrollo desde el triunfo de su movimiento armado. Ahí visitó diversas sitios en el país, convivió con intelectuales y estudiantes, analizó la historia del país, y su actualidad, y comparó sus estadísticas. En una de esas caminatas Carpentier lo abordó, para discutir con el francés un tema que a ambos les preocupaba: el acto de escribir, el rumbo que debía tomar ese acto de creación. Aquí un fragmento de esa conversación.
- Observo que desde hace mucho tiempo no escribe usted una novela. ¿Es, acaso, porque considera que el teatro constituye un medio de expresión más directo?
En modo alguno. Tengo enormes deseos de escribir una novela actualmente. Pero debo decir, a la vez, que jamás terminaré Los caminos de la libertad. Todo lo que en ese ciclo me faltaba por narrar ha quedado demasiado lejos de nosotros.
-¿No cree usted, además, que la novela necesita de planteamientos nuevos en cuanto a la forma?
Tanto lo creo que es acaso la razón por la cual vacilo por ahora en meterme en el trabajo de escribir otra novela. Es evidente que nuestra visión del hombre actual, en función de sus distintos contextos –en lo social, en lo colectivo, en lo subconsciente; en su voluntad de decir 'sí' o decir 'no' a cuanto lo circunda...- reclama un nuevo tipo de novela. Todavía seguimos presos en las mallas de la novela psicológica del siglo XIX. Busco otra manera de decir las cosas, pero aún no la he encontrado.
–¿No cree usted que donde es más urgente hallar nuevos mecanismos es en el diálogo? Me parece que el diálogo novelesco, tal como se viene escribiendo corrientemente en nuestra época, es tan falso como el del teatro de Victorien Sardou, pongamos en caso.
Estoy totalmente de acuerdo. El diálogo novelesco estereotipado se nos hace intolerable. Sin embargo, el público está tan acostumbrado a sus giros, a los tratamientos convencionales del lenguaje hablado, que cuando el novelista busca caminos nuevos, deja de seguirlos...
–¿...Ocurriendo, entonces, lo que ocurre con los relatos de un Samuel Beckett?
Exactamente. Pero esta evidencia, sin embargo, no excluye el problema de la forma. Nadie puede creer que la preocupación por la forma puede desaparecer en el arte, sin que el arte desaparezca al propio tiempo. El arte es forma; es poner en forma. Dicho esto, hay también el formalista: aquel que tiene una forma antes de tener un contenido. Pero quien haya sacado algo que decir de todo un conjunto de experiencias, de acciones o de pasiones, o bien hace un reportaje si adopta la forma común, o es artista –auténticamente artista- si deja que lo 'por decir' desarrolle sus propias exigencias de forma. Recordemos el ejemplo de Proust, que fue un testigo fiel de su época, pero altamente consciente del problema de la forma "....Me sorprende lo que se habla del comprometimiento del escritor en estos días, cuando lo cierto es que el escritor siempre está comprometido. Cuando dice la verdad, se compromete con la causa de la verdad. Cuando dice la verdad a medias, está comprometido con los que sueñan con una verdad a medias. Y cuando no escribe, también está comprometido. Comprometido con aquellos que quisieran ocultar una verdad".
Fonte: http://www.cafeliterario.com/index.php?option=com_content&task=view&id=274&Itemid=347
|