"A gente teve aquela fase dos anos 70, do tal romance-reportagem, com João Antonio, um dos casos mais bem-sucedidos da época. Outros foram menos bem-sucedidos e alguns até péssimos. Mas, de lá para cá, desde os anos 80, acho que se criou um fosso entre as duas coisas. Quer dizer, a literatura passou a ter muito espaço na imprensa, criaram-se os cadernos literários, tudo bem, mas, enquanto gênero, criou-se uma divisão: literatura é uma coisa e jornalismo é outra. A minha impressão, muito apressada mas que se reforça cada vez mais, é que isso jogou a literatura muito para o mundo exclusivo do artificial. Estou me referindo à literatura brasileira, é claro".
Fonte: MUHLHAUS, Carla. Por trás da entrevista. Rio de Janeiro: Record, 2007.
"Creio que o escritor habita um abismo existente entre a imaginação e a realidade. O escritor, eu diria, tem um pé na imaginação, outro no real e se oferece, para usar uma imagem de Rilke, como uma espécie profana de anjo, que se lança no abismo na esperança de tapá-lo. O escritor é um habitante privilegiado desse abismo aberto entre o destino e a liberdade e escreve para tentar preenchê-lo, num esforço para ligar as duas partes – tarefa que, na verdade, jamais conseguirá cumprir. O jornalista, ao contrário, tem por princípio um apego radical à realidade. Ele a privilegia e sua tarefa, igualmente impossível, é escavá-la, trazê-la à luz, e jamais traí-la. Nesse sentido, jornalismo e literatura são atividades absolutamente distintas, embora estejam marcadas pela mesma impossibilidade. Por mais que se agarre ao real, o jornalista jamais deixará de estar lidando, também, e sempre, com aspectos imaginários, ou ilusórios – e nesse sentido, sobretudo nas mãos dos grandes jornalistas, daqueles que já perderam as ilusões a respeito da ‘verdade absoluta’ e da ‘pureza dos fatos’, o jornalismo pode ser aproximar sim, um pouco, da literatura. Mas jamais será literatura.
Fonte: COSTA, Cristiane H. <www.penadealuguel.com.br>, 3 de agosto de 2006.
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