"Há escritores que têm a colaboração do seu lazer e da sua preguiça. Há outros que têm a colaboração de sua operosidade. Estou nesse segundo grupo porque o trabalho para mim é sempre trabalho contínuo. Não sou daquele tipo de escritor para o qual a criação acontece, mas para o qual a criação existe e não posso transformá-la porque aquilo faz parte da minha natureza... No meu caso, há uma peculiaridade porque minha pena é muito veloz, escrevo a mão. Nos meus originais, às vezes, ligo duas ou três palavras, como se escrevesse em alemão, mecanismo que vem de um fluxo de narrativa, como se eu obedecesse a um transe, mas na verdade é um processo em que minha mão acompanha a velocidade da própria criação. Acho que se soubesse taquigrafia, teria uma obra bem maior. A grande verdade, porém, é que o meu ideal desde cedo foi fazer uma obra de romancista, e nós sabemos para o que nascemos. Sonhei com isso sempre, mas a realidade que tinha à mão era a da minha província. Para chegar a ser romancista, precisei vencer etapas porque a literatura corresponde também a um aprendizado. Para fazer um romance a gente se aprimora até dominar aquela máquina, aquela maneira de construir. Dediquei-me a isso com tal afinco que hoje faço um romance com relativa facilidade porque tenho a técnica e sei o que vou fazer".
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/01/1986 - Beatriz Marinho
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